É fundamental à utilização de banheiros públicos femininos por travestis e transexuais femininas, e inaceitável que proponham banheiros específicos para transgêneros.
A proibição de utilização de banheiro feminino por uma pessoa travesti ou transexual feminina configura violação à proteção da dignidade humana e ao direito de liberdade sexual e de gênero, prejuízos que se materializam contra indivíduos e grupos percebidos e subjugados como minorias altamente estigmatizadas em nossa sociedade.
Neste campo, pode-‐se relacionar o direito à utilização de banheiros com o conteúdo essencial do direito de igualdade, com a proibição de discriminação direta e indireta por motivo de identidade de gênero, sem esquecer da intersecção entre tal critério proibido de discriminação e a idade, dada a intensidade dos prejuízos para crianças e adolescentes transexuais
Há quem diga que a utilização de banheiros por pessoas trans femininas coloque em risco a segurança das demais usuárias. Esse medo, à primeira vista concedível, não encontra substrato na realidade, nem é capaz de justificar tratamento restritivo. Isso porque não há qualquer dado concreto que ampare o temor de que pessoas trans sejam ameaças ou cometam violência contra usuárias de banheiros femininos, o que faz juridicamente ilegítima tal restrição, pois encontram-se fundadas em meras suposições preconceituosas, desprovidas de qualquer suporte fático concreto.
Ao contrário, o que se relata são episódios de violência moral e física contra travestis e transexuais femininas quando são obrigadas a usar o banheiro feminino.
A discriminação é direta porque é decorrente da intenção explícita de barrar a população trans em instalações abertas ao público que possibilitam o exercício adequado do direito fundamental à saúde. Nesse caso, é precisamente a condição transexual que motiva a restrição, de forma consciente e proposital, o que é fácil de constatar e contrastar com o direito de igualdade e seu mandamento antidiscriminatório.
Esta disputa por qual banheiro deve ser utilizado pelas travestis e transexuais frequentemente ganha espaço na mídia e no Poder Judiciário, sendo retratada a partir de diversos pontos de vista, seja em apoio às travestis e transexuais, seja defendendo que não devam utilizar o banheiro feminino.
Quanto à privacidade como fundamento para proibição de utilização, pondera-‐se sobre a parcialidade e insuficiência do argumento, na medida em que transexuais obrigados a utilizar um banheiro que não corresponde à sua identidade de gênero também tem sua privacidade violada.
São de conhecimento público os episódios de violência desferida contra pessoas trans em banheiros masculinos, como também evidente o prejuízo à saúde, que abarca o direito de realizar necessidades fisiológicas não apenas em ambientes apropriados, como também livre de discriminação.
Isso sem falar da exposição pública vexatória e desrespeitosa à honra, à imagem e à vida privada das pessoas trans que, no caso relatado da repercussão geral que será julgada pelo STF, resultou na perda de controle e na excreção nas próprias vestes, em espaço público, sob o olhar de transeuntes.
A transexualidade, não importa se abordada biomédica ou socialmente, é indissociável do modo de ser e de estar no mundo das pessoas transexuais. Ela não é atributo ou característica secundária ou acessória, possível de desagregar da existência humana de tais pessoas. Desse modo, desconsiderar ou excluir pessoas em virtude de tal condição identitária significa ferir o âmago da proteção constitucional da dignidade humana.
É o que acontece quando se postula simplesmente ignorar a transexualidade num espaço de vida e convívio tão significativo e vital como o acesso a banheiros abertos ao público ignorando sua condição de identidade de gênero, feminina.
Em suma, no tocante à proteção constitucional da dignidade humana e ao direito fundamental à auto-determinação sexual, não reconhecer o direito fundamental à utilização de banheiro feminino por uma travesti ou transexual feminina implica rejeitar a possibilidade de ser e de existir como se é, afetando algo essencial para o modo único, irrepetível e original da pessoa; inviabilizam-‐se também as condições sem as quais a auto-‐determinação e a liberdade sexuais e de gênero, simplesmente deixam de ser possíveis.
Diante de tais violações, não se calem. Denunciem!
Trechos do Artigo Direitos humanos, transexualidade e “direito dos banheiros”
Roger Raupp Rios e Alice Hertzog
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