Instituições LGBTI Nacionais repudiam omissão do Brasil em assinatura do plano de ação LGBTI+ no MERCOSUL

Direitos e Política, Notas e Ofícios

NOTA PÚBLICA CONJUNTA EM FORMA DE DENÚNCIA À POPULAÇÃO LGBTI+ BRASILEIRA E EM REPÚDIO A OMISSÃO DO ESTADO BRASILEIRO EM REUNIÃO SOBRE A PROTEÇÃO DAS PESSOAS LGBTI+ JUNTO AOS PAISES DO MERCOSUL

As instituições que assinam coletivamente essa nota vem a público chamar atenção da população LGBTI+ brasileira, assim como pesquisadores/ras, aliados/das, legisladores/ras e membros do judiciário, executivo e demais áreas de defesa dos direitos humanos que o BRASIL RECUSOU O USO DOS TERMOS IDENTIDADE DE GENERO, EXPRESSÃO DE GÊNERO E CRIMES DE ÓDIO contra a população LGBTI+ no plano de trabalho discutido em reunião na Comissão Permanente de Pessoas LGBTI com as mais altas autoridades em direitos humanos do MERCOSUL  divergindo de países como Argentina, Uruguai e Paraguai sobre o tema.

É estarrecedor que no mesmo ano em que houve um aumento próximo de 70% nos casos de assassinatos de travestis e mulheres trans entre os meses de janeiro e agosto de 2020, em relação ao mesmo período do ano passado, o Brasil tome tal decisão ignorando que o Transfeminicídio é o assassinato sistemático da população trans motivado pelo ódio e repulsa à identidade e expressão de gênero. As pessoas trans são mortas por expressarem uma identidade de gênero divergente daquela que lhe foi imposta no nascimento e por fazerem isso publicamente. ,O Brasil segue triste liderança dos assassinatos contra pessoas trans no mundo nos últimos dez anos, sem que o estado brasileiro tenha tomado qualquer iniciativa para combater essa violência.

Na mais recente versão do Atlas da Violência, publicado pelo Fórum Brasileiro da Segurança Publica, fica nítido o descaso dos estados brasileiros com relação a vida das pessoas trans, quando percebe-se que 15 deles não fazem sequer levantamento de dados sobre violência lgbtifóbica e nenhum dos 26 estados mais o Distrito Federal trouxeram dados sobre assassinato das pessoas LGBTI+. Demonstrando, portanto, que a subnotificação e a negligência com a violência LGBTIfóbica segue presente no modo de atuação do governo.

O atual governo brasileiro não reconhece a cidadania da população de lésbicas, gays, bissexuais,  travestis,  mulheres  transexuais,  homens  trans  e  intersexos  (LGBTI), pois  além de não destinar recursos, ações e projetos em defesa da população LGBTI+, tem  trabalhado  incansavelmente  para  negar  o  seu  acesso  a  direitos  básicos, promovendo  retrocessos  nas  conquistas  de  políticas  pró-LGBTI.

Esse retrocesso e negação de direitos se vê especialmente o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, que em sua  gestão não promove  políticas de  enfrentamento  a  violências  LGBTfóbicas  e/ou  de  gênero – que vêm  aumentando  desde  o inicio de sua gestão -;  deslegitimando  as  evidências  de  vulnerabilidade desta  população,  além  de  extinguir  as  políticas  públicas  e canais de participação social que  buscavam  assegurar  e reconhecer sua cidadania plena.

Entendemos  que  a  gestão  em  vigor  contraria  os  princípios  consolidados  no Estado  democrático  de  direito  e  fere  o  artigo  5º  da  Constituição.  Além  disso  está  em desacordo com diversos tratados internacionais dos quais os Brasil é signatário, como os princípios  de  Yogyakarta,  os  princípios  da  Corte  Interamericana  de  Direitos  Humanos na   Opinião   Consultiva   Nº   24,   que   tratam   dos   temas de   identidade   de   gênero   e  a não discriminação de casais  do mesmo sexo (CIDH,  2017), bem como as  recomendações da própria ONU na defesa da população LGBTI.

Compreendemos que a omissão diante dos temas propostos na reunião da Comissão Permanente LGBTI+ na reunião do Mercosul estão relacionadas às inúmeras declarações LGBTIfóbicas, machistas e/ou racistas do Presidente e agentes do seu governo, bem como da própria Ministra Damares Alves, que   disseminam, legitimam e autorizam diversas formas de violência contra a   população  LGBTI+.   Identificamos correlações entre as declarações de ódio por parte do governo e o aumento dos casos de violências LGBTIfóbicas, assim como o uso do sintagma “ideologia de gênero” buscando fomentar  pânico, medo e estigmas em relação  à população de travestis e transexuais.

Vale ressaltar que a cada 48 horas uma pessoa transexual é barbaramente   assassinada no Brasil e que nesse ano já temos mais casos que no ano de 2019 inteiro, ultrapassando 140 assassinatos. Ainda, segundo as mais recentes   estimativas, acumulamos 82% de exclusão escolar de travestis e transexuais, panorama que aumenta a vulnerabilidade dessa população e favorece os altos índices de violência que estamos expostas no trânsito do dia-a-dia exatamente pelo ódio a nossa identidade de gênero. Não há como discutir um enfrentamento eficaz da violência especifica que essa população sofre sem nomeá-la ou instrumentalizar agentes do estado para termos dados sobre como a violência tem vitimado a população trans brasileira.

Fica nosso repudio público as inações e omissão do Ministério da Mulher, Família e Direitos humanos, que tem usado seus funcionários para se opor aos avanços das conquistas de direitos da população LGBTI+ e aqui repudiamos explicitamente aqueles que estiveram representando o Brasil na referida reunião assumindo o lado contrário da defesa dos direitos humanos da população trans, sendo eles: Marina Reidel – Diretora de Promoção de Direitos LGBT, Vitor Marcelo Almeida – Assessoria Especial de Assuntos Internacionais, Douglas Rodrigues – Coordenador de Assuntos Internacionais, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, e Daniel Leão da Divisão de Direitos Humanos do Ministério das Relações Exteriores.

Enquanto o sangue das Travestis, mulheres Transexuais, Homens trans e demais pessoas trans está nas mãos de vocês, seguiremos resistindo a vocês e a eles!

Brasil, 22 de outubro de 2020.

Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA)

Associação Brasileira LGBTI (ABGLT)

Fórum Brasileiro de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS)

Rede Nacional de Operadores de Segurança LGBTI+ (RENOSP-LGBTI)

Instituto Brasileiro de TransMasculinidades (IBRAT)

Conselho Nacional Popular LGBTI+

Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)

Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL)

Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE)

Rede LésBi Brasil

Articulação Nacional de Psicólogas e Psicólogos LGBTI – ANP LGBTI

Central Única dos Trabalhadores (CUT)

MONART – Movimenta Nacional de Artistas Trans

Rede Nacional de Lesbica, Trans e mulheres Bissexuais na Promoção a Saúde e Controle social para Políticas Públicas (Rede Sapatà)

Diretoria LGBT da UNE

Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil CFOAB

GT 23 da ANPEd

Articulação nacional de gays – Artgay

Movimento sem terra – Mst

Rede Afro LGBT

Associação brasileira de Intersexos – ABRAI