ANTRA concede Título de Presidentas de Honra para Traviarcas Históricas da Instituição

Cultura, Direitos e Política, Justiça

Presidentas de Honra da ANTRA: quando a memória se transforma em futuro e nos lembra que nossos passos vem de longe.

Há gestos que transcendem o tempo. E há reconhecimentos que não se limitam ao ato em si, mas carregam consigo a força de toda uma história coletiva. Assim nasceu, em 2024, a iniciativa inédita da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) de instituir e outorgar o título de Presidenta de Honra, em reverência às travestis e mulheres trans que abriram caminho e tornaram possível o que hoje é a maior rede de pessoas Trans da América Latina.

Mais que uma homenagem, trata-se de um compromisso político com a memória e com o legado das Traviarcas — aquelas que enfrentaram o impossível para garantir que outras pudessem existir com mais dignidade, visibilidade e voz. Ao criar essa honraria a pedido da presidenta Bruna Benevides como seu primeiro ato após ser eleita, a ANTRA afirma que preservar a memória é também resistir, e que cada nome reconhecido é um farol para o presente e um chamado à continuidade da luta.

Entre as primeiras agraciadas estão Claudia Pierre France, Elza Lobão, Fernanda Benvenutty, Janaína Lima, Janaína Dutra, Josy Silva, Monique du Baviera e Raquel Barbosa (in memoriam) — verdadeiras colunas fundadoras do movimento trans brasileiro — e as Presidentas de Honra em vida: Kátia Tapety, Jovanna Baby, Keila Simpson e Indianarae Siqueira, que seguem firmes, com coragem e generosidade, sustentando a travessia de tantas outras.

A entrega da placa que materializa esse reconhecimento tem percorrido os espaços simbólicos e históricos do nosso movimento. Jovanna Baby, uma das fundadoras da ANTRA e figura central na organização do movimento trans no Brasil, recebeu a homenagem durante a 4ª Conferência Nacional LGBTQIA+, realizada em Brasília — um gesto que une o passado à reconstrução de um novo tempo de participação social e democracia.

Indianarae Siqueira, por sua vez, foi agraciada durante a Conferência Estadual LGBTQIA+ do Rio de Janeiro, espaço em que sua trajetória de luta, abrigamento e solidariedade foi celebrada por quem conhece de perto o impacto de sua militância radical e humanizadora.

Keila Simpson, referência incontornável e ex-presidenta da ANTRA, recebeu a homenagem durante as ações da Parada LGBTQIA+ de São Paulo — a maior do mundo, simbolizando que a luta que começou nas margens hoje ocupa as avenidas e o coração do país.

Resta apenas a entrega do título à Kátia Tapety, a primeira travesti eleita vereadora no Brasil, que deverá ser homenageada em janeiro de 2026, durante as celebrações da Semana da Visibilidade Trans, fechando o ciclo das quatro Presidentas de Honra em vida — um gesto que reafirma o elo entre gerações e o respeito pelas pioneiras que ousaram existir quando tudo era interdito.

Para Bruna Benevides, presidenta da ANTRA, instituir e entregar essa honraria em vida é um ato de gratidão e justiça histórica:

É uma honra imensa poder olhar nos olhos dessas mulheres que transformaram o impossível em realidade e dizer: nós reconhecemos vocês. O que somos hoje é fruto do que vocês foram, e do que continuam sendo. Este gesto é uma semente plantada no solo da nossa memória coletiva, para que jamais deixemos de lembrar quem abriu o caminho.

A homenagem se soma a outras ações da ANTRA voltadas à preservação da memória e valorização da população trans e travesti mais velha, como a Traviarcas: Pesquisa Nacional sobre Envelhecimento Trans, atualmente em curso e o pedido de Anistia Coletiva para as Travestis presas em operações policiais na Comissão Nacional de Anistia. Reconhecer as Traviarcas, suas lutas e legado é, portanto, reafirmar o compromisso com um movimento que não esquece suas origens — um movimento que sabe que o futuro se constrói com as mãos e as histórias de quem veio antes.

Em tempos em que o apagamento tenta silenciar nossas narrativas, celebrar essas trajetórias é um ato de amor, coragem e desobediência. Porque sem elas, não estaríamos aqui. Porque viva as Trancestrais, vivas as Presidentas de Honra, viva a luta que continua!

Conferência Nacional LGBTQIA+ aprova proposta prioritária pela imediata implementação do PAESPOPTRANS

Direitos e Política, Eventos, Saúde

Proposta foi a mais votada no Grupo de Trabalho de discussões sobre a saúde LGBTQIA+, ficando como a prioritária dentre as cinco propostas eleitas neste eixo.

A 4ª Conferência Nacional LGBTQIA+ consolidou um avanço significativo para a promoção de políticas de saúde, com a aprovação de uma política essencial no GT 11 – Políticas Públicas Interseccionais de Promoção Integral do Direito à Saúde. A proposta aprovada em plenária final com 99% dos presentes, representa um marco na luta pelo direito à saúde da população LGBTQIA+, reforçando a necessidade de políticas específicas para travestis, pessoas trans e intersexo em todas as fases da vida, desde a infância até a terceira idade.

A proposta entrou como prioritária por ter sido a mais votada do GT e estabelece diretrizes claras para a atualização da Política Nacional de Saúde Integral da População LGBTQIA+, revisando a Portaria nº 2.803/2013, e destaca a urgência na implementação do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans). O programa visa estruturar uma linha de cuidado integral, fortalecendo os ambulatórios multiprofissionais e garantindo a inclusão de medicamentos hormonais na RENAME, no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) e no Programa Farmácia Popular do Brasil, com dispensação acessível e humanizada em todas as regiões do país.

A ANTRA, em articulação com o IBRAT, desempenhou papel central nesta conquista. Desde 2024, a entidade atua junto ao Supremo Tribunal Federal e outros órgãos para assegurar a efetivação do PAES, defendendo a saúde integral da população trans como prioridade nacional. A presidenta da ANTRA, Bruna Benevides, reforça que “a luta pelo PAES não é apenas por acesso a hormônios ou cirurgias afirmativas; é pela garantia de dignidade, respeito e cuidado integral, considerando as vulnerabilidades específicas da nossa população.”

O texto aprovado pela conferência também enfatiza a necessidade de uma gestão integrada, com sistema de dados robusto para monitoramento das políticas de saúde, além da educação permanente para profissionais da saúde. Entre os pontos principais estão a ampliação do acesso às cirurgias afirmativas, políticas de saúde sexual e reprodutiva, cuidados com ISTs/HIV, planejamento familiar, justiça reprodutiva e a valorização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para garantir apoio à saúde mental.

No nível hospitalar, a proposta prevê credenciamento de hospitais e universidades federais ao processo transexualizador, além de cuidados críticos em urgência e emergência voltados às demandas de pessoas trans, travestis e intersexo, especialmente considerando as consequências de procedimentos clandestinos, como a injeção de silicone industrial. A abordagem é interseccional, priorizando população periférica, idosa, infantojuvenil, com deficiência, indígena, quilombola, migrante, refugiada, tradicional, ribeirinha, em situação de rua ou privada de liberdade.

A aprovação histórica da proposta em saúde é celebrada como um avanço histórico na consolidação de políticas públicas que reconhecem e atendem às múltiplas dimensões das vidas LGBTQIA+. A conferência reafirma o compromisso do Estado com a saúde integral e o direito à dignidade, destacando a importância do trabalho contínuo da ANTRA e seus parceiros na defesa de políticas inclusivas, estruturadas e interseccionais, que efetivamente respondam às necessidades da população LGBTQIA+ em todas as suas diversidades.

Texto integral da proposta:

GT 11 – Políticas públicas interseccionais de promoção integral do direito à saúde

Fortalecer e atualizar a política nacional de saúde integral da população LGBTQIA+, com revisão da Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013, e aprovação imediata, regulamentação e implementação do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans), que contemple todos os ciclos de vida com atenção a crianças, adolescentes e famílias, através da implementação de uma linha de cuidado integral à saúde de pessoas trans e intersexo atrelada à expansão dos ambulatórios multiprofissionais, da inclusão dos medicamentos hormonais na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), assim como no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) e no Programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB). Deve ser incluída a dispensação pela Farmácia Popular, assegurando a articulação intersetorial, a descentralização e regionalização dos serviços e o atendimento humanizado em todos os níveis de complexidade, além da criação de um sistema integrado de dados para gestão e monitoramento da política, com enfoque no fortalecimento e financiamento adequado da atenção primária como centro de acesso, coordenação e integralidade dos cuidados às pessoas LGBTQIA+, garantindo: educação permanente das pessoas trabalhadoras da saúde; ampliação do acesso às cirurgias afirmativas de gênero; ampliação do acesso às políticas de saúde sexual e reprodutiva (incluindo os cuidados com ISTs/HIV, planejamento familiar e justiça reprodutiva); ampliação do acesso às políticas de saúde mental – mediante valorização e fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e; no nível hospitalar – através do credenciamento de hospitais e universidades federais ao processo transexualizador – de cuidados críticos na rede de urgência e emergência, com enfoque nas pessoas trans, travestis e intersexo, especialmente considerando as demandas referentes às sequelas de procedimentos clandestinos (injeção de silicone industrial), considerando os recortes de gênero, território, classe e raça, bem como a priorização das especificidades das populações em maior vulnerabilidade, como as periféricas, idosas, infanto-juvenis, com deficiência, indígenas, quilombolas, migrantes, refugiadas, fronteiriças, tradicionais, dos campos, florestas e águas, em situação de rua e privadas de liberdade.

ANTRA participa de Seminário Internacional pelos direitos LGBTQIA+

Direitos e Política, Justiça

Nos dias 20 e 21 de outubro, o Instituto Rio Branco, em Brasília, se torna o epicentro de um debate histórico sobre os rumos das políticas públicas voltadas à população LGBTQIA+ em escala global. O evento “Diálogos Internacionais LGBTQIA+: Garantia de Direitos em Âmbito Global” reunindo representantes de governos, organismos multilaterais e lideranças da sociedade civil em um espaço de articulação política e diplomática fundamental diante do avanço das agendas antigênero e antidereitos que ameaçam conquistas históricas em diversas partes do mundo.

O seminário reafirma o papel do Brasil como articulador regional na promoção da igualdade e da dignidade humana, ao mesmo tempo em que destaca a urgência de fortalecer mecanismos de proteção e cooperação internacional. A presença de nomes como Macaé Evaristo, ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Symmy Larrat, secretária nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, e Collette Spinetti Núñez, primeira mulher trans a ocupar um cargo no governo do Uruguai e atual secretária de Direitos Humanos da Presidência da República, conferiu ao evento um caráter histórico e simbólico. Spinetti, que também preside o Comitê Mundial Trans da ILGA Mundo, representa um marco de avanço institucional na América Latina, inspirando a consolidação de políticas transnacionais de igualdade e reconhecimento.

Entre os temas centrais, destacaram-se as discussões sobre o enfrentamento das agendas antigênero, a cooperação internacional e a construção de políticas públicas no contexto Sul-Sul. O primeiro dia foi marcado por painéis que analisaram o cenário político e jurídico global e apresentaram boas práticas implementadas por diferentes países para a garantia dos direitos LGBTQIA+. O debate contou com a contribuição de especialistas como Sonia Corrêa, do Observatório de Sexualidade e Política, e Keila Simpson, coordenadora do CPDD LGBT na Bahia, que trouxeram uma perspectiva crítica sobre os retrocessos e as resistências atuais.

Outro ponto alto foi o painel “Diálogos Globais: Cooperação Multilateral e Direitos LGBTQIA+”, que reuniu representantes do PNUD, ACNUR, UNAIDS e Banco Mundial, além de delegações de países latino-americanos e europeus. O encontro abordou o papel dos organismos internacionais na construção de políticas de equidade e combate à violência, destacando a importância de vincular ações locais às agendas globais de direitos humanos.

No segundo dia, o painel Brasil-União Europeia abre espaço para um rico intercâmbio de experiências em políticas públicas LGBTQIA+, reforçando o compromisso com a construção de marcos regulatórios sólidos, programas de inclusão e estratégias de combate à discriminação. Encerrando o evento, o painel “Diálogos Projeção Futuro” aponta caminhos para o fortalecimento das políticas e da governança global em direitos humanos.

A ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transexuais teve uma participação estratégica nesse momento de reconstrução e reafirmação democrática. Sua presidenta, Bruna Benevides, participa da mesa de encerramento, levando a voz das travestis e transexuais do Brasil para o centro do diálogo internacional. Ressaltando que este é um tempo de vigilância e resistência, mas também de alianças e esperança. “Estamos vivendo um cenário global de rearticulação das forças conservadoras, e é fundamental que o Brasil reafirme sua posição ao lado dos direitos humanos, da democracia e da vida”, afirma.

A presença da ANTRA, ao lado do IBRAT, da ABGLT e outras entidades da sociedade civil no evento simboliza mais do que representatividade: traduz o compromisso histórico do movimento trans e LGBTQIA+ brasileiro com a construção de políticas públicas inclusivas, baseadas na dignidade, na equidade e na justiça social. Em meio aos desafios impostos pelas ofensivas antigênero, o diálogo internacional se torna um instrumento vital para a defesa da cidadania e para a consolidação de uma agenda global comprometida com a diversidade e com o direito de existir plenamente.

Os Diálogos Internacionais LGBTQIA+ mostram que resistir é também construir pontes. Em um mundo onde a intolerância tenta se organizar em escala planetária, fortalecer alianças e promover cooperação é um ato de coragem. E é exatamente esse o tom do encontro: reafirmar que a luta por direitos não conhece fronteiras, e que cada voz que se ergue em defesa da vida LGBTQIA+ ecoa por todos os continentes.

ANTRA protocola pedido histórico para reconhecimento do Pajubá como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil

Cultura, Direitos e Política, Justiça

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) protocolou, no dia 20 de outubro de 2025, o Ofício solicitando à deputada federal Erika Hilton a apresentação de um projeto de lei que reconheça o Pajubá — ou Bajubá — como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, conforme os parâmetros técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A iniciativa inédita no país propõe que essa linguagem ancestral e insurgente, criada e difundida por travestis e mulheres trans, seja formalmente reconhecida como parte do patrimônio cultural do país, com ações de salvaguarda, documentação, ensino e fomento cultural.

O pedido é um marco no reconhecimento da memória e da produção simbólica das travestis brasileiras, que historicamente criaram formas próprias de comunicação como estratégia de sobrevivência e de afirmação identitária em contextos de exclusão, perseguição e violência. O documento encaminhado pela ANTRA reforça que o Pajubá/Bajubá é mais do que uma linguagem — é uma “tecnologia transcestral”, um legado linguístico que atravessa gerações e conecta saberes, afetos e resistências.

De origem afro-brasileira desde o século XX, o Pajubá é um socioleto — isto é, uma variação linguística criada e utilizada por um grupo social específico — formado a partir da incorporação de palavras de origem iorubá e nagô, combinadas a expressões populares e gírias urbanas. Sua difusão se intensificou a partir das décadas de 1970 e 1980, especialmente nos circuitos travestis e nos espaços culturais e noturnos das grandes cidades brasileiras, consolidando-se como um símbolo de identidade coletiva e que foi posteriormente incorporado como elemento importante de comunicação afetiva dentro da comunidade LGBTQIA+.

O ofício destaca que o reconhecimento oficial do Pajubá como Patrimônio Imaterial não é apenas um gesto de valorização cultural, mas uma medida de reparação simbólica e justiça social, uma vez que fortalece políticas públicas voltadas à memória e à preservação das expressões culturais marginalizadas. A proposta prevê ações de salvaguarda em parceria com o IPHAN e o Ministério da Cultura, incluindo a produção de acervos orais, dicionários comunitários, materiais educativos e projetos de formação sobre a importância do Pajubá para a cultura brasileira.

Entre as referências apresentadas pela ANTRA no pedido, ganha destaque a obra “Diálogo de Bonecas”, escrita por Jovanna Baby e publicada em 1995 pelo ISER/PIM, considerada a primeira publicação impressa em Pajubá/Bajubá. A obra é um marco literário e político por registrar e celebrar o modo de falar das travestis brasileiras, numa época em que o país ainda negava visibilidade a essas identidades. Segundo pesquisas acadêmicas recentes, Diálogo de Bonecas é também um testemunho da oralidade travesti e de como essa linguagem atuou como escudo de proteção em tempos de censura e repressão.

O documento da ANTRA cita ainda trabalhos de pesquisadoras como Amara Moira, que descreve o Pajubá como um “território linguístico de invenção e insurgência”, e estudos como Pajubá: Justiça Estética e Patrimônio Imaterial (UDESC), que defendem a sua inscrição como manifestação cultural a ser preservada pelo Estado.

Em nota, a presidenta da ANTRA, Bruna Benevides, destacou o caráter histórico da iniciativa:

“Este pedido é um gesto de reparação simbólica e de justiça cultural. O Pajubá é uma herança viva das travestis brasileiras, um idioma da resistência e do afeto. Reconhecê-lo como patrimônio cultural imaterial é afirmar que nossas histórias, nossas vozes e nossos saberes têm lugar na memória oficial do país.”

A ANTRA reafirma seu compromisso com a valorização da memória travesti e com o fortalecimento das políticas de justiça cultural, e anuncia que dará continuidade à interlocução com o IPHAN e o Ministério da Cultura para garantir que o processo de inventariação e registro do Pajubá seja conduzido com protagonismo e participação direta das comunidades travestis e trans.

A proposta busca ainda proteger o uso do Pajubá de apropriações indevidas ou pejorativas, assegurando que sua difusão se mantenha ligada aos princípios de respeito, pertencimento e valorização da diversidade cultural. O reconhecimento do Pajubá como patrimônio imaterial, destaca o ofício, é também um passo essencial para garantir políticas de educação patrimonial, incentivo à pesquisa e fortalecimento da autoestima de pessoas trans e travestis em todo o país.

Com este movimento, a ANTRA consolida-se como referência na defesa da cultura, da memória e da dignidade travesti e trans no Brasil, e reafirma que o legado linguístico das travestis brasileiras — tão vivo nas ruas, nos palcos, nas escolas de samba e nas redes de afeto — merece estar também registrado entre os bens culturais mais valiosos do país.


📚 Referências Principais

  • BABY, Jovanna. Diálogo de Bonecas. Rio de Janeiro: ISER/PIM, 1995.
  • MOIRA, Amara. “A Neca de Amara Moira: uma voz pajubeyra”. Periódico Folio, UESB.
  • “Pajubá: Justiça Estética e Patrimônio Imaterial”. Revista Urdimento, UDESC.
  • IPHAN. Patrimônio Cultural Imaterial. Disponível em: gov.br/iphan.

ANTRA solicita ao Ministério da Defesa dispensa do alistamento militar obrigatório para mulheres trans e travestis

Direitos e Política, Justiça

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) protocolou, Ofício junto ao Ministério da Defesa, solicitando providências urgentes para corrigir distorções e constrangimentos que vêm afetando mulheres trans e travestis no processo de alistamento militar obrigatório. O documento denuncia uma prática incompatível com os direitos constitucionais e a dignidade humana, uma vez que obriga mulheres trans a se submeterem a procedimentos destinados exclusivamente a pessoas do gênero masculino — realidade que fere diretamente o reconhecimento da identidade de gênero garantido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Na prática, o atual sistema de alistamento militar exige que mulheres trans obtenham o Certificado de Dispensa de Incorporação (CDI) para conseguirem retificar seu registro civil, incluindo nome e gênero. Esse processo as força a comparecer pessoalmente a Juntas do Serviço Militar — ambientes frequentemente hostis e constrangedores — apenas para cumprir uma formalidade burocrática que não deveria sequer lhes ser aplicada em claro descompasso com o direito a autodeterminação de gênero que lhes é assegurado. Em muitos casos, quando o pedido é feito após os 18 anos, ainda são impostas multas por suposto “atraso no alistamento”, penalizando ilegalmente essas mulheres por uma obrigação da qual, constitucionalmente, estão dispensadas.

A ANTRA argumenta que essa exigência não apenas viola o princípio da igualdade, mas perpetua situações de discriminação institucional, nas quais o Estado impõe barreiras para o exercício pleno da cidadania. Diante disso, a entidade propôs ao Ministério da Defesa a criação de um procedimento administrativo específico e acessível, que reconheça o direito dessas mulheres à autodeterminação de gênero sem constrangimentos nem exigências indevidas.

Entre os pedidos apresentados pela ANTRA, destacam-se:

  1. A retirada da obrigatoriedade de alistamento militar para mulheres trans e travestis que vivem pública e abertamente sua identidade de gênero feminina;
  2. A explicitação formal de que essas mulheres estão dispensadas de qualquer comprovação de quitação militar;
  3. A remissão das multas aplicadas indevidamente, quando decorrentes de registros civis anteriores incompatíveis com a identidade de gênero;
  4. A uniformização de protocolos de atendimento em Juntas Militares e cartórios, assegurando tratamento respeitoso e em conformidade com o direito à identidade de gênero;
  5. A criação de um canal eletrônico no site de alistamento militar, que permita solicitar a dispensa mediante autodeclaração e envio de documentos que atestem a identidade de gênero, com emissão de um documento oficial substitutivo ao CDI.

A medida proposta pela ANTRA busca garantir segurança jurídica, acessibilidade e eficiência administrativa, além de reforçar o compromisso do Estado com a dignidade humana e com os direitos fundamentais das pessoas trans. No caso, como o alistamento não é obrigatório para mulheres, ele não pode ser exigido as mulheres trans sob nenhuma hipótese, devendo esta se alistar exclusivamente de forma voluntária, por desejo expresso da própria.

“Não se trata apenas de ajustar um procedimento burocrático, mas de corrigir uma distorção histórica que tem submetido mulheres trans a situações de constrangimento, tratamento diferenciado em relação as demais mulheres, discriminação e exclusão institucional”, afirmou Bruna Benevides, presidenta da ANTRA.

O ofício também destaca a viabilidade técnica e jurídica da proposta, amparada nas decisões do STF e nas resoluções do CNJ que asseguram o reconhecimento da identidade de gênero como direito fundamental. A criação de um mecanismo online, por exemplo, eliminaria violências institucionais, deslocamentos desnecessários, reduziria bucrocracias e custos, e ampliaria o acesso a um procedimento digno, sem ferir qualquer princípio administrativo ou militar.

Paralelamente ao envio do documento ao Ministério da Defesa, a ANTRA acionou o mandato da deputada federal Duda Salabert (PDT/MG), solicitando sua intermediação política e parlamentar sobre o tema. A deputada já manifestou apoio à pauta e se comprometeu a buscar diálogo com o Executivo e o Legislativo para garantir uma resposta efetiva. Essa articulação é vista pela entidade como um passo estratégico para que a questão seja enfrentada com responsabilidade institucional e sensibilidade social.

Com essa ação, a ANTRA reafirma seu papel histórico de vigilância e incidência política em defesa dos direitos das pessoas trans no Brasil. A entidade reitera que a garantia da cidadania plena exige o fim de procedimentos que tratam de maneira diferente, criminalizam identidades ou burocratizam existências, e convida as autoridades a assumirem o compromisso de adequar as políticas públicas aos princípios de equidade e respeito à diversidade.

“O Estado não pode seguir tratando a identidade de gênero como um problema a ser administrado, mas como um direito a ser respeitado. Nossa luta é por dignidade, e dignidade não se adia”, conclui a ANTRA.


ABGLT e ANTRA reforçam denúncia sobre avanço da agenda antigênero e cobram atenção internacional à defesa de mulheres trans na CSW70

Direitos e Política, Justiça

A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) apoiada pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) apresentaram à 70ª Sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW70), das Nações Unidas, um documento contundente em defesa dos direitos humanos de travestis e mulheres trans no Brasil e na América Latina. Conforme as diretrizes da ONU Mulheres, organizações não governamentais com status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social da ONU podem submeter declarações escritas.

O texto reafirma o compromisso das organizações com a Agenda 2030 e com a plena implementação da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), alertando para o avanço global das políticas antigênero que ameaçam conquistas históricas no campo dos direitos das mulheres e da população LGBTQIA+.

O documento enviado aponta que travestis e mulheres trans seguem sendo alvo de violência estrutural e sistêmica, com negação de acesso à educação, saúde, trabalho e moradia, além de exposição extrema à violência física e simbólica. O Brasil, novamente, aparece como o país que mais mata pessoas trans no mundo — um reflexo direto da omissão do Estado e da persistência de estruturas patriarcais, racistas e cisnormativas que impedem a participação dessas mulheres em espaços de poder e decisão.

As entidades denunciam também a manipulação de discursos de “proteção às mulheres” para legitimar iniciativas legislativas e políticas que, na prática, promovem exclusão e institucionalizam a transfobia. Tais movimentos, segundo o texto, “ameaçam diretamente os princípios de igualdade e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”, em especial os ODS 5 (Igualdade de Gênero), 10 (Redução das Desigualdades) e 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes).

Recomendações estratégicas

Entre as recomendações apresentadas no documento à comunidade internacional e aos Estados-membros da ONU, destacam-se:

  • Implementar políticas efetivas de combate à violência contra mulheres trans, com dados desagregados por identidade de gênero;
  • Garantir acesso universal à saúde integral e específica para pessoas trans, com reconhecimento de gênero sem barreiras patologizantes;
  • Promover a participação política e institucional de travestis e mulheres trans em espaços de decisão;
  • Condenar e prevenir iniciativas antigênero que buscam institucionalizar a exclusão e a discriminação sob o pretexto de “proteger mulheres e crianças”;
  • Reafirmar a perspectiva de gênero como eixo estruturante das políticas para mulheres, assegurando a proteção explícita da identidade de gênero no âmbito da CSW e de outros mecanismos internacionais.

A ABGLT e a ANTRA reforçam, ainda, a importância da participação direta de mulheres trans na formulação, acompanhamento e avaliação das políticas globais de igualdade de gênero, e pedem que os mecanismos internacionais de direitos humanos estejam atentos à rápida disseminação da agenda antigênero no Brasil e em outros países.

“A defesa das mulheres trans é parte inseparável da luta global das mulheres. Não há feminismo possível se a exclusão de mulheres trans for admitida. Defender nossas vidas é defender o próprio sentido da igualdade e da justiça de gênero”, afirma Bruna Benevides, presidenta da ANTRA.

O envio do documento às Nações Unidas marca um passo decisivo na reafirmação de que a igualdade de gênero deve incluir todas as mulheres, sem retrocessos e sem concessões à retórica discriminatória da agenda antigênero.

Para Victor de Wolf, presidente da ABGLT, “como a maior entidade LGBTQIA+ do país, reafirmamos nosso compromisso histórico com a luta trans e com a defesa inegociável dos direitos humanos. Nenhuma política de igualdade será completa enquanto travestis e mulheres trans continuarem à margem.”

O envio conjunto da ABGLT e da ANTRA reforça o compromisso das organizações brasileiras com a promoção dos direitos humanos e da igualdade de gênero, alinhando-se aos esforços globais para garantir a participação ativa e representativa de pessoas LGBTQIA+ nas discussões internacionais sobre políticas públicas e direitos humanos.

Entidades do Comitê Nacional de Saúde LGBTQIA+ cobram o Ministério pela Publicação Imediata do Programa de Saúde Trans

Direitos e Política, Saúde

Entidades que compõem o Comitê Técnico Nacional de Saúde da População LGBTQIA+, instituído pela Portaria nº 8.425/2025/MS, enviaram ofício conjunto ao Ministro da Saúde, Sr. Alexandre Padilha, e a outras coordenações estratégicas do ministério, demandando a implementação imediata do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans). O documento destaca a urgência de uma política de saúde integral, pública e de qualidade para a população trans em todo o território nacional.

No ofício, as entidades argumentam que o Brasil vive um “cenário de indefinição” no que tange à garantia do direito à saúde para a população LGBTQIA+, especialmente para as pessoas trans, incluindo crianças e jovens trans, que continuam a enfrentar desafios estruturais e omissões persistentes. Um dos principais pontos de crítica é a defasagem da portaria que regulamenta o Processo Transexualizador no SUS, cuja última atualização ocorreu em 2013, há doze anos, tornando-a técnica, científica e socialmente ultrapassada devido ao descompasso com a CID-11 e a despatologização das identidades trans pela Organização Mundial da Saúde.

O documento ressalta o trabalho técnico e multidisciplinar já realizado pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 1.334/2023 do próprio Ministério da Saúde, onde muitas destas mesmas entidades puderam colaborar. Esse esforço, que contou com as contribuições de profissionais qualificados, médicos e outros profissionais de saúde, e da sociedade civil, que resultou na elaboração do PAES Pop Trans, um marco que, segundo as associações, fortalece os princípios de universalidade, integralidade e equidade do SUS.

O pedido central é bem direto e ocorre em meio aos ataques promovidos pelo CFM a saúde trans: a publicação imediata do PAES Pop Trans, “conforme sua versão integralmente construída e apresentada à sociedade”. As organizações afirmam que a implementação do programa é essencial para assegurar um atendimento especializado e humanizado, representando um “compromisso efetivo do Estado brasileiro com a reparação de lacunas históricas” na saúde transespecífica e no fortalecimento da saúde pública como política de justiça social.

Apoio Amplo do Movimento Social

O pedido mobilizado pela ANTRA e IBRAT, é ratificado por um conjunto expressivo de instituições nacionais titulares do Comitê Técnico Nacional de Saúde da População LGBTQIA+, demonstrando a unidade e alinhamento do movimento em torno da pauta. Entre as entidades que se comprometeram assinando o documento estão:

  • Articulação Brasileira de Gays (ArtGay)
  • Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT)
  • Associação Brasileira Intersexo (ABRAI)
  • Associação Brasileira Profissional para a Saúde Integral de Pessoas Travestis, Transexuais e Intersexo (ABRASITTI)
  • Associação Mães da Resistência
  • Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA)
  • Coletivo LGBTI+ Sem Terra
  • Coletivo Tybyra – Indígenas LGBTQIA+
  • Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS)
  • Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT)
  • Instituto Nacional de Mulheres Redesignadas (INAMUR)
  • Intersexo Brasil
  • Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)
  • Mães pela Diversidade
  • Ong Minha Criança Trans (MCT)
  • Rede de mulheres imigrantes lésbicas, bissexuais e trans (MILBI+)
  • Rede Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais Negras Feministas – CANDACES
  • Rede Nacional de Negras e Negros LGBT (REDE AFRO LGBT)

Nota Pública da ANTRA sobre a participação de mulheres trans e travestis na Conferência Nacional de Mulheres

Direitos e Política, Justiça, Notas e Ofícios

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA – vem a público se posicionar sobre episódios ocorridos durante a 5ª Conferência Nacional de Mulheres, realizada em Brasília, entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro de 2025.

O primeiro deles, é que nossa presença na abertura da conferência, com visibilidade e direito a fala, além de um dos momentos mais comentados da conferência, foi fruto de decisão coletiva do CNDM, espaço de participação social que organizou a conferência junto ao Ministério das Mulheres e nos deu a missão – que assumimos com muita honra – de representar vozes diversas.

As entidades trans que atualmente integram o Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres foram democraticamente eleitas, figurando entre as mais votadas. Sendo titulares a ANTRA e o FONATRANS, além do INAMUR como suplente.

A ANTRA, primeira organização trans a ocupar este colegiado, conquistou sua cadeira pelo voto direto das participantes da sociedade civil em processo eleitoral, tendo cumprido todos os requisitos exigidos, assegurando legitimidade e reconhecimento de sua relevância histórica na luta pelos direitos das mulheres trans e travestis junto aos feminismos no Brasil.

É necessário reforçar que todas as representantes trans e travestis presentes na Conferência foram eleitas em suas respectivas etapas municipais e estaduais, chegando à plenária nacional com pleno respaldo das próprias delegações de mulheres. Sua presença, portanto, não apenas reflete a legalidade do processo conferencial, como também reafirma a importância política e social de suas trajetórias para o fortalecimento da luta das mulheres no país.

Lamentamos que pessoas ligadas a grupos transexcudentes, mesmo presentes na conferência, se digam boicotadas ou impedidas de participar, e estejam tentado distorcer os acontecimentos para produzir narrativas de vitimização e fomentar hostilidade contra mulheres trans e travestis, incitando ódio, publicando mentiras e manipulando a realidade dos fatos para promover agitação nas redes sociais.

Esses ataques, tanto às pessoas trans quando ao CNDM e o MM, embora não sejam uma novidade, não refletem a realidade da Conferência, que foi marcada por diversas manifestações legítimas de diversos segmentos sociais.

Entre elas, destacamos a marcha realizada na Alameda das Homenageadas, em que vozes trans se levantaram contra a transfobia estrutural que faz do Brasil o país que mais mata mulheres trans no mundo — uma realidade que impacta diretamente a saúde, a dignidade e a expectativa de vida de nossa comunidade.

As mulheres participantes da Conferência deixaram evidente que não há espaço para posturas excludentes ou manipuladas por interesses da extrema-direita.

As mulheres trans e travestis não foram rejeitadas: foram acolhidas, reconhecidas e legitimadas pelas próprias mulheres presentes. A rejeição recaiu sobre agentes que promovem segregação e alimentam transfobias diversas alinhadas ao patriarcado, que buscam sabotar avanços em políticas públicas inclusivas e igualitárias.

Por ampla maioria — 95% das mulheres presentes — a plenária final reafirmou compromisso com o enfrentamento à transfobia, e de forma unânime aprovou moção de repúdio a movimentos antigênero e trans-excludentes.

Reiteramos que a ANTRA e as mulheres trans e travestis têm o direito de participar e disputar espaços de decisão política, sem ter suas pautas desvirtuadas para atender interesses obscuros.

Espantalhos lançados por grupos de ódio foram rechaçados. E o recado da Conferência Nacional de Mulheres afirma que este espaço não será capturado por propostas que violam direitos humanos ou ímpetos segregacionistas.

Aproveitamos para agradecer imensamente nossas companheiras de luta e de afetos, por seguirem ao nosso lado neste momento que exige solidariedade entre todas nós, especialmente as conselheiras que compõem o CNDM e os seguimentos sociais, entidades representativas, sindicatos, coletivos feministas, organizações de mulheres negras, marchas de mulheres e todas as formas de organização que levaram cada uma de nós a esse momento histórico.

A ANTRA parabeniza cada travesti e mulher trans que esteve presente na 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, vindas de todas as regiões do país, em sua maioria negras, periféricas e interioranas. Vocês foram imensas e nossa gratidão é imensurável!

Mesmo diante de episódios de transfobia, mantiveram-se firmes, altivas e com qualidade nos debates, reafirmando que mulheres trans e travestis são parte essencial da luta feminista e popular.

Chegamos na VCNPM juntas, vivas e esperançosas. E saímos ainda mais fortalecidas, grandonas e alinhadas para seguir em frente dizendo não a qualquer agenda e discurso que fragilize nossas alianças históricas.

Agradecemos ao Ministério das Mulheres pela atuação firme, comprometida com os direitos humanos e atento as vozes das mulheres em sua diversidade e interseccionalidade, e sobretudo pelos esforços destinados a realização da conferência, mesmo em um cenário tão desafiador.

Sem medo podemos reafirmar que seguiremos firmes, com todas as mulheres comprometidas com a construção de um Brasil livre de racismo, misoginia, capacitismo, machismo, lesbofobia e transfobia.

01 de outubro de 2025.

Associação Nacional de Travestis e Transexuais

Pastora Evangélica defende mulheres trans e travestis e contra a transfobia na VCNPM

Direitos e Política, Justiça

Durante a 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (CNPM), um dos momentos mais significativos e emocionantes foi protagonizado pela Pastora Valéria Vilhena, representante das Evangélicas pela Igualdade de gênero no Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres (CNDM), leu carta escrita pelo colegiado que se posicionou publicamente em defesa de travestis e mulheres trans diante dos recorrentes casos de transfobia registrados durante o processo conferencial — em diversos espaços e até mesmo nos espaços da conferência nacional.

Em meio a ataques e provocações vindos de grupos antigênero e transexcludentes — que, mesmo se dizendo “boicotados”, seguiram incitando o ódio e a desinformação dentro dos espaços institucionais da conferência nacional —, a fala da pastora ganhou força simbólica e política. Representando o CNDM, ao lado da Ministra das Mulheres Marcia Lopres, de Jovanna Baby (FONATRANS), Bruna Benevides (ANTRA) e Raquel (INAMUR), ela se ergueu com firmeza para repudiar toda e qualquer forma de discriminação, e reafirmar que travestis e mulheres trans são mulheres, chamando à responsabilidade ética e espiritual todas as pessoas comprometidas com a justiça e a dignidade humana.

O gesto de Valéria Vilhena — uma mulher evangélica progressista, com trajetória reconhecida no campo dos direitos humanos — rompeu estereótipos e lançou uma mensagem poderosa: é possível professar fé e, ao mesmo tempo, defender o amor, a igualdade e o respeito. Em um país que segue sendo o que mais mata pessoas trans no mundo, seu posicionamento representa um sinal de esperança e de resistência contra a onda de fundamentalismo religioso e moral que tenta sequestrar o debate público sobre gênero e diversidade.

A postura da pastora foi extremamente celebrada e também contribuiu para fortalecer o ambiente democrático da conferência e inspirou levantes na plenária onde todas as presentes disseram não a Transfobia, assim como a aprovação da Moção de Repúdio aos grupos antigênero e transexcludentes, que foi acolhida com ampla adesão das delegadas presentes. Esse movimento coletivo reafirmou a importância do CNDM como espaço de diálogo, inclusão e defesa dos direitos humanos, e mostrou que as mulheres brasileiras — cis, trans, negras, indígenas, periféricas, com deficiência — seguem unidas na luta por um país sem exclusões.

“O ato da pastora Valéria Vilhena foi um gesto de grandeza, bondade e coragem. Em um momento em que o fundamentalismo religioso tenta instrumentalizar o ódio, ver uma mulher de fé se colocar ao lado das travestis e mulheres trans reafirma que o amor e a justiça também são valores evangélicos. Esse gesto simboliza o futuro que queremos: um Brasil de respeito, empatia e liberdade”, declarou Bruna Benevides, presidenta da ANTRA.

Num contexto em que pessoas trans seguem sendo perseguidas, silenciadas e criminalizadas, a solidariedade de lideranças religiosas progressistas abre novas pontes de diálogo e demonstra que fé e direitos humanos não são opostos — são aliados na construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. Na ocasião também foi lida carta contra o racismo na mesma perspectiva escrita pelo CNDM.

A seguir, reproduzimos na íntegra a Nota Pública emitida pelo Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres, lida e defendida pela pastora Valéria Vilhena durante a conferência:


Nota Pública

O Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres reafirma seu compromisso com políticas que reconheçam a diversidade e a interseccionalidade das mulheres no Brasil. A pluralidade de vozes neste colegiado e na V CNPM expressa a construção de um país mais justo, sem espaço para discriminação ou desumanização.

O direito à identidade de gênero é um direito humano e fundamental, ligado à dignidade, à liberdade e à felicidade garantidas pela Constituição Federal e por tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e cuja plena efetivação devemos assegurar.

Travestis e transexuais são mulheres. E a realidade que enfrentam exige políticas públicas urgentes para que o Brasil deixe de ser o país que mais as assassina.

Composto por 38 instituições representativas, o CNDM reafirma sua posição contra a transfobia e todas as formas de violência, em consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a CEDAW, a ONU Mulheres e decisões do STJ e STF que asseguram proteção e direitos à comunidade trans.

Este espaço só faz sentido quando exercitamos empatia e solidariedade. Não aceitaremos que ele seja capturado por práticas de exclusão ou violência.

Diante dos recorrentes casos de transfobia e das tentativas de criminalização das identidades trans, este Conselho repudia qualquer iniciativa que busque segregá-las em relação às demais mulheres. Os casos serão tratados nas esferas cabíveis e este Conselho seguirá vigilante ante a essas investidas.

Somos solidárias a todas as travestis e mulheres trans que chegaram até aqui e reafirmamos nosso compromisso com a vida de cada uma.

Vidas trans importam: vivas, felizes e dignas!

ANTRA e Ministério das Mulheres lançam guia pioneiro “Todas as Mulheres: Dignidade, Cidadania e Direitos Humanos para Travestis e Mulheres Trans”

Direitos e Política, Educação

Durante a 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, foi lançado o guia “Todas as Mulheres: Dignidade, Cidadania e Direitos Humanos para Travestis e Mulheres Trans”, uma iniciativa inédita e histórica que marca o início de uma nova etapa nas políticas públicas voltadas à população trans no Brasil.

O material é fruto da parceria estratégica entre o Ministério das Mulheres e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA, formalizada por meio do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) nº 6/2025, o primeiro firmado pelo Ministério diretamente com uma organização trans. Essa aliança institucional contou ainda com o apoio da Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política, da ONU Mulheres, da campanha Livres & Iguais, liderada pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), e com a expertise acumulada da ANTRA, entidade fundada em 1993 e reconhecida nacional e internacionalmente pela defesa dos direitos da população trans.

O lançamento, conduzido pela Ministra das Mulheres como uma das entregas na conferências, celebrou não apenas um novo instrumento de política pública, mas um compromisso real e histórico com as identidades trans. O ACT simboliza a união entre Estado e sociedade civil em torno de ações concretas voltadas à promoção da dignidade, da cidadania e dos direitos humanos de travestis e mulheres trans.

O guia chega em um momento simbólico: o Brasil celebra os 30 anos da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim e os 50 anos do Dia Internacional da Mulher, marcos globais que reafirmam a urgência de garantir que nenhuma mulher seja deixada para trás. Em um país onde a transfobia ainda produz índices alarmantes de violência — com 97% das vítimas de assassinato sendo travestis e mulheres trans, majoritariamente jovens e negras —, reconhecer essas existências é uma condição essencial para a democracia.

Mais do que um compêndio normativo, o guia é um manifesto pela vida, pela diversidade e pela igualdade de direitos. Reunindo bases legais nacionais e internacionais, o documento apresenta recomendações de organismos de direitos humanos, explica o uso correto de terminologias e pronomes, e traz informações práticas sobre o acesso a direitos em áreas como saúde, educação, trabalho, participação política e identidade.

A iniciativa responde ao dever do Estado brasileiro de garantir proteção contra todas as formas de discriminação, em consonância com a Plataforma de Pequim, com as recomendações da CEDAW e com os compromissos internacionais assumidos pelo país.

O lançamento também marcou o início da série de publicações “Todas as Mulheres”, que ampliará o olhar sobre a diversidade das mulheres brasileiras, incluindo futuras edições dedicadas a mulheres indígenas, negras, lésbicas, mulheres com deficiência, de povos e comunidades tradicionais, entre outras — proposta defendida pela ANTRA durante o processo de construção do guia.

O guia está disponível para download gratuito e ampla circulação, com o objetivo de alcançar travestis e mulheres trans em todo o território nacional. E em breve será lançado em formato físico.

“Este guia representa um compromisso concreto do Estado com as nossas vidas. Ele afirma que travestis e mulheres trans são parte do presente e do futuro do Brasil, e que não há democracia possível sem o reconhecimento pleno de todas as mulheres”, declarou Bruna Benevides, presidenta da ANTRA.

A ANTRA celebra este marco pioneiro e reafirma seu compromisso em continuar atuando pela efetivação dos direitos humanos, pela cidadania plena e pela dignidade de todas as travestis e mulheres trans, fortalecendo a agenda feminista, popular e democrática no país.

Participaram da construção do guia:

  • Rubi Martins dos Santos Correia, Coordenadora de Diversidade da SENATP/MM
  • Bruna Benevides, Presidenta da ANTRA
  • Maria Eduarda Borba Dantas, ONU Mulheres
  • Angela Pires Terto, Livres & Iguais / ONU Direitos Humanos

O guia está disponível abaixo, no site da ONU Mulheres e aqui no site da ANTRA na guia Cartilhas.