ANTRA reafirma centralidade do PAES Pop Trans em reunião do Comitê Técnico Nacional de Saúde LGBTIA+

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A Associação Nacional de Travestis e Transexuais, ANTRA, participou da reunião do Comitê Técnico Nacional de Saúde LGBTIA+, espaço institucional do Ministério da Saúde, estratégico para a formulação, acompanhamento e cobrança de políticas públicas voltadas à população LGBTQIA+. Indicada pelas entidades membras para representar a sociedade civil, a ANTRA teve sua participação na mesa de abertura conduzida pela psicóloga Sofia Favero, reforçando o compromisso histórico do movimento trans com a incidência política qualificada e baseada em evidências.

A abertura da reunião foi marcada pela reafirmação de que a presença dos movimentos sociais nesses espaços não é simbólica nem protocolar. Em um país que completa 18 anos consecutivos na liderança do ranking mundial de assassinatos de pessoas trans, segundo monitoramentos internacionais, decisões institucionais na área da saúde possuem impacto direto sobre a vida, a dignidade e a sobrevivência dessa população. A defesa do princípio “Nada sobre nós sem nós” foi reiterada como condição mínima para qualquer avanço real.

Durante a intervenção, a ANTRA destacou que a transexualidade deve ser compreendida como uma pauta de direitos humanos, e não como categoria médica ou agenda moral. Pessoas trans demandam cuidado integral, científico e baseado em evidências, com políticas públicas que enfrentem desigualdades estruturais e superem práticas patologizantes ainda presentes em parte das instituições do Estado.

Psicologa Sofia Favero representando a ANTRA na reunião

Nesse contexto, o PAES Pop Trans foi apresentado como a agenda prioritária e unificadora do movimento trans brasileiro. A ANTRA enfatizou que a ausência dessa política mantém ações fragmentadas, frágeis e vulneráveis a retrocessos, inclusive diante de disputas conservadoras que atravessam o próprio governo. O PAES Pop Trans é apontado como eixo estruturante para organizar fluxos de cuidado, acesso aos serviços, financiamento, produção de pesquisas, definição de orçamento e transparência, além de garantir alinhamento ao CID-11 e à perspectiva da despatologização, superando exigências abusivas como laudos e barreiras institucionais.

A entidade também cobrou posicionamentos objetivos do Ministério da Saúde. Um dos pontos centrais foi a solicitação de apresentação das evidências utilizadas pelo órgão para se manifestar ao Supremo Tribunal Federal afirmando que a Resolução do Conselho Federal de Medicina não causa danos à população trans. A ANTRA questionou como se sustenta tal afirmação sem a existência de pesquisas consistentes, especialmente no que se refere ao bloqueio puberal. Também foi questionado se haverá, de fato, a publicação de portaria e a implementação da política antes do próximo ciclo eleitoral, ou se o tema seguirá sendo adiado. Foi lembrado ainda que um ofício sobre o PAES Pop Trans, assinado por 19 instituições integrantes do comitê, permanece sem resposta oficial.

Além da política nacional, a ANTRA apresentou outras agendas relevantes para a saúde da população trans. Entre elas, a criação de um Grupo de Trabalho específico sobre silicone industrial, com foco em linhas de cuidado, protocolos de atendimento e incentivo à pesquisa para pessoas que vivem com complicações decorrentes do uso dessas substâncias. Também foi defendida a necessidade de editais do Ministério da Saúde para financiamento de pesquisas e para a realização de encontros e fóruns voltados a grupos específicos da população LGBTQIA+.

A ampliação das políticas de saúde sexual e reprodutiva também esteve no centro do debate. A ANTRA destacou lacunas no acesso à dignidade menstrual, a métodos contraceptivos como o implante hormonal e à garantia do aborto legal para homens trans, pessoas transmasculinas e não binárias que podem gestar, reforçando que a exclusão desses grupos revela falhas estruturais na formulação das políticas públicas.

Por fim, a entidade reiterou seu compromisso com o enfrentamento à desinformação e às narrativas antitrans que têm se infiltrado inclusive em conselhos profissionais. A ANTRA reafirma que ciência não pode ser instrumentalizada para legitimar exclusões e violências. Direitos se constroem com responsabilidade pública, participação social e compromisso ético com a vida.

Conferência Nacional LGBTQIA+ aprova proposta prioritária pela imediata implementação do PAESPOPTRANS

Direitos e Política, Eventos, Saúde

Proposta foi a mais votada no Grupo de Trabalho de discussões sobre a saúde LGBTQIA+, ficando como a prioritária dentre as cinco propostas eleitas neste eixo.

A 4ª Conferência Nacional LGBTQIA+ consolidou um avanço significativo para a promoção de políticas de saúde, com a aprovação de uma política essencial no GT 11 – Políticas Públicas Interseccionais de Promoção Integral do Direito à Saúde. A proposta aprovada em plenária final com 99% dos presentes, representa um marco na luta pelo direito à saúde da população LGBTQIA+, reforçando a necessidade de políticas específicas para travestis, pessoas trans e intersexo em todas as fases da vida, desde a infância até a terceira idade.

A proposta entrou como prioritária por ter sido a mais votada do GT e estabelece diretrizes claras para a atualização da Política Nacional de Saúde Integral da População LGBTQIA+, revisando a Portaria nº 2.803/2013, e destaca a urgência na implementação do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans). O programa visa estruturar uma linha de cuidado integral, fortalecendo os ambulatórios multiprofissionais e garantindo a inclusão de medicamentos hormonais na RENAME, no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) e no Programa Farmácia Popular do Brasil, com dispensação acessível e humanizada em todas as regiões do país.

A ANTRA, em articulação com o IBRAT, desempenhou papel central nesta conquista. Desde 2024, a entidade atua junto ao Supremo Tribunal Federal e outros órgãos para assegurar a efetivação do PAES, defendendo a saúde integral da população trans como prioridade nacional. A presidenta da ANTRA, Bruna Benevides, reforça que “a luta pelo PAES não é apenas por acesso a hormônios ou cirurgias afirmativas; é pela garantia de dignidade, respeito e cuidado integral, considerando as vulnerabilidades específicas da nossa população.”

O texto aprovado pela conferência também enfatiza a necessidade de uma gestão integrada, com sistema de dados robusto para monitoramento das políticas de saúde, além da educação permanente para profissionais da saúde. Entre os pontos principais estão a ampliação do acesso às cirurgias afirmativas, políticas de saúde sexual e reprodutiva, cuidados com ISTs/HIV, planejamento familiar, justiça reprodutiva e a valorização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para garantir apoio à saúde mental.

No nível hospitalar, a proposta prevê credenciamento de hospitais e universidades federais ao processo transexualizador, além de cuidados críticos em urgência e emergência voltados às demandas de pessoas trans, travestis e intersexo, especialmente considerando as consequências de procedimentos clandestinos, como a injeção de silicone industrial. A abordagem é interseccional, priorizando população periférica, idosa, infantojuvenil, com deficiência, indígena, quilombola, migrante, refugiada, tradicional, ribeirinha, em situação de rua ou privada de liberdade.

A aprovação histórica da proposta em saúde é celebrada como um avanço histórico na consolidação de políticas públicas que reconhecem e atendem às múltiplas dimensões das vidas LGBTQIA+. A conferência reafirma o compromisso do Estado com a saúde integral e o direito à dignidade, destacando a importância do trabalho contínuo da ANTRA e seus parceiros na defesa de políticas inclusivas, estruturadas e interseccionais, que efetivamente respondam às necessidades da população LGBTQIA+ em todas as suas diversidades.

Texto integral da proposta:

GT 11 – Políticas públicas interseccionais de promoção integral do direito à saúde

Fortalecer e atualizar a política nacional de saúde integral da população LGBTQIA+, com revisão da Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013, e aprovação imediata, regulamentação e implementação do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans), que contemple todos os ciclos de vida com atenção a crianças, adolescentes e famílias, através da implementação de uma linha de cuidado integral à saúde de pessoas trans e intersexo atrelada à expansão dos ambulatórios multiprofissionais, da inclusão dos medicamentos hormonais na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), assim como no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) e no Programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB). Deve ser incluída a dispensação pela Farmácia Popular, assegurando a articulação intersetorial, a descentralização e regionalização dos serviços e o atendimento humanizado em todos os níveis de complexidade, além da criação de um sistema integrado de dados para gestão e monitoramento da política, com enfoque no fortalecimento e financiamento adequado da atenção primária como centro de acesso, coordenação e integralidade dos cuidados às pessoas LGBTQIA+, garantindo: educação permanente das pessoas trabalhadoras da saúde; ampliação do acesso às cirurgias afirmativas de gênero; ampliação do acesso às políticas de saúde sexual e reprodutiva (incluindo os cuidados com ISTs/HIV, planejamento familiar e justiça reprodutiva); ampliação do acesso às políticas de saúde mental – mediante valorização e fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e; no nível hospitalar – através do credenciamento de hospitais e universidades federais ao processo transexualizador – de cuidados críticos na rede de urgência e emergência, com enfoque nas pessoas trans, travestis e intersexo, especialmente considerando as demandas referentes às sequelas de procedimentos clandestinos (injeção de silicone industrial), considerando os recortes de gênero, território, classe e raça, bem como a priorização das especificidades das populações em maior vulnerabilidade, como as periféricas, idosas, infanto-juvenis, com deficiência, indígenas, quilombolas, migrantes, refugiadas, fronteiriças, tradicionais, dos campos, florestas e águas, em situação de rua e privadas de liberdade.

Entidades do Comitê Nacional de Saúde LGBTQIA+ cobram o Ministério pela Publicação Imediata do Programa de Saúde Trans

Direitos e Política, Saúde

Entidades que compõem o Comitê Técnico Nacional de Saúde da População LGBTQIA+, instituído pela Portaria nº 8.425/2025/MS, enviaram ofício conjunto ao Ministro da Saúde, Sr. Alexandre Padilha, e a outras coordenações estratégicas do ministério, demandando a implementação imediata do Programa de Atenção Especializada à Saúde da População Trans (PAES Pop Trans). O documento destaca a urgência de uma política de saúde integral, pública e de qualidade para a população trans em todo o território nacional.

No ofício, as entidades argumentam que o Brasil vive um “cenário de indefinição” no que tange à garantia do direito à saúde para a população LGBTQIA+, especialmente para as pessoas trans, incluindo crianças e jovens trans, que continuam a enfrentar desafios estruturais e omissões persistentes. Um dos principais pontos de crítica é a defasagem da portaria que regulamenta o Processo Transexualizador no SUS, cuja última atualização ocorreu em 2013, há doze anos, tornando-a técnica, científica e socialmente ultrapassada devido ao descompasso com a CID-11 e a despatologização das identidades trans pela Organização Mundial da Saúde.

O documento ressalta o trabalho técnico e multidisciplinar já realizado pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 1.334/2023 do próprio Ministério da Saúde, onde muitas destas mesmas entidades puderam colaborar. Esse esforço, que contou com as contribuições de profissionais qualificados, médicos e outros profissionais de saúde, e da sociedade civil, que resultou na elaboração do PAES Pop Trans, um marco que, segundo as associações, fortalece os princípios de universalidade, integralidade e equidade do SUS.

O pedido central é bem direto e ocorre em meio aos ataques promovidos pelo CFM a saúde trans: a publicação imediata do PAES Pop Trans, “conforme sua versão integralmente construída e apresentada à sociedade”. As organizações afirmam que a implementação do programa é essencial para assegurar um atendimento especializado e humanizado, representando um “compromisso efetivo do Estado brasileiro com a reparação de lacunas históricas” na saúde transespecífica e no fortalecimento da saúde pública como política de justiça social.

Apoio Amplo do Movimento Social

O pedido mobilizado pela ANTRA e IBRAT, é ratificado por um conjunto expressivo de instituições nacionais titulares do Comitê Técnico Nacional de Saúde da População LGBTQIA+, demonstrando a unidade e alinhamento do movimento em torno da pauta. Entre as entidades que se comprometeram assinando o documento estão:

  • Articulação Brasileira de Gays (ArtGay)
  • Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT)
  • Associação Brasileira Intersexo (ABRAI)
  • Associação Brasileira Profissional para a Saúde Integral de Pessoas Travestis, Transexuais e Intersexo (ABRASITTI)
  • Associação Mães da Resistência
  • Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA)
  • Coletivo LGBTI+ Sem Terra
  • Coletivo Tybyra – Indígenas LGBTQIA+
  • Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS)
  • Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT)
  • Instituto Nacional de Mulheres Redesignadas (INAMUR)
  • Intersexo Brasil
  • Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)
  • Mães pela Diversidade
  • Ong Minha Criança Trans (MCT)
  • Rede de mulheres imigrantes lésbicas, bissexuais e trans (MILBI+)
  • Rede Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais Negras Feministas – CANDACES
  • Rede Nacional de Negras e Negros LGBT (REDE AFRO LGBT)

ANTRA e IBRAT recorrem contra decisão de Dino que põe saúde de crianças trans em segundo plano

Direitos e Política, Saúde

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e o Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT) anunciaram que irão recorrer da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, que cassou a liminar concedida em ação civil pública movida pela PFDC/AC. A liminar havia restabelecido o direito ao acesso de crianças e adolescentes trans aos tratamentos de saúde indispensáveis à sua saúde psicológica, social e integral, suspensos após ação do Conselho Federal de Medicina (CFM). Dino acatou pedido do Conselho e reconheceu que a competência para julgar o tema é da Suprema Corte, e não da primeira instância, que havia suspendido a resolução.

A decisão de Dino, considerada surpreendente e politicamente ambígua, interrompe um avanço construído a duras penas por organizações e profissionais de saúde que há décadas lutam pela consolidação de protocolos de cuidado baseados em evidências científicas e no respeito à dignidade humana. Ao optar por argumentos de natureza meramente procedimental, o ministro desconsidera o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e ignora os impactos concretos e imediatos de sua decisão na vida de crianças e jovens trans, que dependem dessas políticas para existir com saúde, segurança e acolhimento. A decisão foi fortemente celebrada pelo CFM, grupos antitrans e por políticos da extrema-direita.

Bruna Benevides, presidenta da ANTRA, afirmou que a decisão “revela um perigoso descompasso entre a Constituição e a prática judicial, que acaba privilegiando tecnicalidades jurídicas em detrimento da vida de crianças e adolescentes trans. O Supremo deveria ser a última instância de proteção dos direitos fundamentais, não mais um espaço onde nossas existências são submetidas a disputas políticas e religiosas”.

O advogado e constitucionalista Paulo Iotti, que representa a ação, destacou que a liminar cassada se baseava em fundamentos sólidos do MPF, que buscava assegurar a continuidade dos tratamentos reconhecidos como essenciais pela ciência e pela Organização Mundial da Saúde. “A decisão de Dino prioriza o debate processual sobre a urgência da matéria, ignorando que estamos lidando com direitos humanos e saúde pública. Cada dia sem acesso ao cuidado é uma violação concreta de direitos”, afirmou.

A crítica ao ministro também se insere num contexto mais amplo de observação sobre sua trajetória recente no STF. Reportagem do site Plató Brasil mostrou o aumento das menções à Bíblia em seus votos e falas públicas, levantando questionamentos sobre o uso crescente de referências religiosas no exercício de um cargo que, pela Constituição, deve se pautar pela laicidade do Estado. A matéria ainda destaca que Dino vem disputando simbolicamente com André Mendonça — indicado por Jair Bolsonaro e autodeclarado “terrivelmente evangélico” — o papel de ministro com discurso mais afinado à moral cristã, em um momento em que o país precisa de decisões baseadas em direitos e não em dogmas.

A aproximação entre convicções religiosas e a condução de temas que envolvem a população LGBTQIA+, especialmente a pauta trans, preocupa especialistas em direitos humanos. Esse não é a primeira decisão de Dino contra os direitos trans. Para Bruna Benevides, “quando um ministro do STF opta por citar a Bíblia ao lado da Constituição, abre-se um precedente perigoso. A posição do Estado e a garantia de direitos universais passam a ser substituídas por moralismos seletivos que excluem as minorias, sobretudo pessoas trans que neste momento sao alvos de agendas politicas contra nossos direitos e que tem ganhado força com as ordens executivas de Donald Trump e pela extrema direita global”.

Manifestação em ADI 7806

Paralelamente ao recurso, ANTRA e IBRAT, também protocolaram manifestação na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7806), na qual requerem que o relator, ministro Cristiano Zanin, adote a mesma postura procedimental de Flávio Dino — deferindo medida cautelar em decisão individual para posterior análise do Plenário, a fim de garantir segurança jurídica e continuidade da proteção à saúde de crianças e adolescentes trans. O pedido é assinado pelo Advogado da ADI 7806, Paulo Iotti.

O CFM ignora a Medicina Baseada em Evidências. Todos os Centros de Referência que enviaram informações ao processo, a pedido do ministro Zanin, confirmaram que o bloqueio hormonal da puberdade em crianças trans e a hormonização a partir dos 16 anos são reversíveis e promovem bem-estar psicológico e social, enquanto sua ausência causa sofrimento, depressão, risco de suicídio e automedicação. Mostraram que princípios biomédicos da beneficência e da não-maleficência justificam nossa ação, mostrando que as proibições do CFM são inconstitucionais, anticientíficas, arbitrárias e desproporcionais, violando direitos fundamentais à saúde, ao livre desenvolvimento da personalidade e à não-discriminação“, complementa Iotti.

Segundo as entidades, trata-se de uma manifestação que vinha sendo elaborada há meses e que aguardava apenas os pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR) para ser protocolada. No documento, rebatem ponto a ponto as afirmações negacionistas e anticientíficas apresentadas pelo Conselho Federal de Medicina no processo, sustentando seus argumentos com respaldo em estudos e manifestações de entidades médicas nacionais e internacionais. O alinhamento entre a posição do Ministério da Saúde, CFM e AGU chamou atenção de entidades da sociedade civil que publicaram nota de repúdio.

A manifestação reafirma, com base nas evidências apresentadas pelos principais centros de referência do país, a necessidade do bloqueio hormonal da puberdade em crianças trans e da hormonização em adolescentes trans a partir dos 16 anos, como medidas essenciais para a preservação da saúde psicológica e social, pelos benefícios comprovados que trazem e pelos graves prejuízos que sua ausência acarreta.

Os argumentos foram elaborados a partir de pareceres técnicos de instituições de excelência requisitados pelo ministro Zanin, entre elas o Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero do Hospital das Clínicas de São Paulo (AMTIGOS/HC-SP), o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFM/USP), o Programa Transdisciplinar de Identidade de Gênero do Hospital das Clínicas de Porto Alegre (PROTIG/HCPA), o Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (NESA/UERJ), o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU) e o Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia (HUPES/UFBA).

O recurso e a manifestação conjunta marcam um momento decisivo na luta pela manutenção de políticas públicas de saúde voltadas à população trans infantojuvenil, ameaçadas por decisões judiciais que flertam com o retrocesso e a desresponsabilização do Estado. “Não estamos falando de ideologia, mas de saúde pública e direitos fundamentais”, concluiu Benevides. “O que está em jogo não é apenas uma liminar, mas o reconhecimento de que nossas crianças e jovens têm o direito de crescer com dignidade, amparados por um Estado que deve proteger — e não julgar — quem são.

Especialistas lançam “Nota Técnica sobre o Acesso a Saúde de Crianças Trans”

Direitos e Política, Notas e Ofícios, Saúde

A nota visa a orientar familiares, profissionais de saúde e comunidade escolar sobre o acompanhamento de crianças trans em circuitos de cuidado.

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), convidou diferentes profissionais, incluindo de saúde (física e mental), pesquisadores, ativistas e integrantes da sociedade civil, com interesse comum em revisar modos de acompanhar crianças e jovens trans que acionam a exigência de laudos e diagnósticos que produzem barreiras significativas no acesso a serviços de saúde adequados.

A nota tem como objetivo central orientar familiares e profissionais quanto à construção de cuidados com crianças trans e, para tanto, é fundamental que tais práticas estejam asseguradas pelos direitos humanos e que se engajem no enfrentamento de possíveis disparidades e violações éticas. Assim, são apresentados procedimentos de cuidados que não reforçam discursos medicalizantes sobre vivências trans – que devem ser acompanhadas por práticas que fortaleçam suas existências e cidadanias, a dizer, práticas não interessadas em “descrever” ou “atestar” uma verdade quanto ao gênero, mas, sim, que apostem no caráter produtivo da diversidade na infância.

Intitulada de “Do modelo transpatologizante ao cuidado transespecífico“a nota se constitui como uma ferramenta importante no enfrentamento de narrativas que pretendem através do negacionismo cientifico e do pânico moral proibir a garantia do acesso a cuidados específicos para crianças trans e criminalizar profissionais, familliares e responsáveis. E será utilizada para defender uma posição firme em defesa dos direitos das crianças trans junto a Projetos de Lei, CPI ou quaisquer outra ação que pretenda impedir o acesso a cuidados transespecíficos.

Pretende ainda contribuir, através de produção de narrativas propositivas e recomendações para erradicar a ideia falaciosa de “epidemia trans”ou de que existiria um suposto lobby para “transformar crianças cis em trans”, quando na verdade estamos vendo a patrulha de (cis)gênero tentando impor e defender a cisgenerificação compulsória sobre aquelas pessoas que não se enquadram no padrão cissexista de ser e existir.

Recomendamos a leitura da nota com atenção e sua ampla disseminação. Clique aqui para baixar e ler a nota na íntegra: Nota Técnica Crianças Trans – ANTRA

A nota contou ainda com a adesão e o apoio das seguintes instituições:

Acontece Arte e Política LGBTI+
Aliança Nacional LGBTI+
Aprosba
ArtGay Paraná
Articulação Brasileira de Gays, Bissexuais e Transmasculinos – ARTGAY
Articulação Brasileira de Jovens Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis
Articulação Brasileira de Lésbicas
Articulação e Movimento para Travestis e Transexuais de Pernambuco
Associação Baiana de Travestis Transexuais e Transgêneros em Ação
Associação Brasileira de Estudos da Trans-Homocultura
Associação Brasileira de Lésbicas, gays, bissexuais, travestis transexuais e intersexo
Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS
Associação Brasileira Profissional Para a Saúde Integral de Pessoas Travestis, Transexuais e Intersexo
Associação Cearense de Diversidade e Inclusão
Associação da Parada do Orgulho LGBT de Santos
Associação das Travestis, Homens e Mulheres Transexuais do RN
Associação das Travestis/Transexuais e LGBT+ de Camocim
Associação de Apoio defesa e Cidadania Dos Homossexuais, Bissexuais e Transexuais do Cariri.
Associação de travestis e transexuais de Foz do Iguaçu “Casa de Malhú”
Associação Mães pela Diversidade
Associação Nordestina de LGBT
ASSOCIAÇÃO NORDESTINA DE LGBT ANLGBT
Associação Transbordamos
Bancada Feminista do PSOL
Casa Florescer
Casa Rosa – assistencial e cultural LGBT
CATS – Coletivo de Artistas Transmasculines 
Centro de cidadania LGBT+ de são João do Rio do peixe PB
Clínica Jurídica LGBTQIA+ da UFF
Coletivo 086
Coletivo ABRACE
Coletivo Clã Das Lobas
Coletivo Colmeia
COLETIVO LGBTQIA+ DE SINOP
Coletivo Mães do Arco-íris
Comissão de Mulheres e Relações de Gênero – CRP03
Conselho Federal de Psicologia
Conselho Munucipal pelos direitos da população LGBTQIA+ de Niterói
Conselho Regional de Psicogia 11° Região
Conselho Regional de Psicologia – Minas Gerais
Conselho Regional de Psicologia -02 Pe
Conselho Regional de Psicologia 10ª Região Pará e Amapá
Conselho Regional de Psicologia 18ª Região (Mato Grosso)
Conselho Regional de Psicologia 2ª Região
Conselho Regional de Psicologia 6ª Região – São Paulo
Conselho Regional de Psicologia do Maranhão.  Crp22
Conselho Regional de Psicologia do Paraná – CRP-08
Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro
Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul (CRP 7° Região)
Conselhor Regional de Psicologia da Bahia
Construindo igualdade
Cores Movimento de Defesa da Cidadania e do Orgulho  LGBT+
Curso Preparatório para LGBTQIA+ PreparaNem Niterói/RJ
DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
DEGENERA – Núcleo de Pesquisa e Desconstrução de Generos
DIADORIM
Distrito Drag
Diversa Arte e Cultura
Erika Hilton – Deputada Federal
Escola Tamuya de Formação Popular
Espaço Transcender do Centro de Saúde Escola Samuel B. Pessoa da Faculdade de Medicina da USP
Fórum Estadual de Travestis e Transexuais do Rio de Janeiro
GADvS – Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero
Grêmio estudantil professor Ronaldo Teodoro
Grupa GSEX (Grupa de corpos, gêneros,  sexualidades e psicologia)
Grupo de Estudos Gênero,  Reprodução e Justiça/ RepGen/IFF/Fiocruz
Grupo de Pesquisa Sexualidade e Escola – Gese
Grupo Diversidade Niterói
Grupo MatematiQueer de Pesquisa e Extensão em Estudos de Gênero e Sexualidades em Educação Matemática – UFRJ
Grupo SEXNAJAS
GT Psicologia, Política e Sexualidades da  Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (ANPEPP)
IBRAT – Instituto Brasileiro de Transmasculinidads
Igreja Cidade de Refúgio Church em Três Lagoas-MS
Instituto Internacional sobre Raça e Igualdade
Instituto LGBT+
Instituto Matizes
Instituto Prios de Políticas Públicas e Direitos Humanos
Laboratório afeTAR – UERJ
Laboratório de Experimentações Artísticas e Reflexões Criativas sobre Cidades, Educação e Saúde. LEARCC/UERJ/IFF-FIOCRUZ
Laboratório de Pesquisa e Extensão em Psicanálise e Saúde / LaPSa UERJ
Linda Brasil – Deputada Estadual (Aracaju/SE)
Mães da Resistência
Mães pela Diversidade
Marginal Artístico Grupo @magxsp
Movimento LGBTQIAPN+ de Cajazeiras Paraiba
Movimento nacional da população em situação de rua do estado de Santa Catarina
Movimento Negro Unificado
MundoInvisivel.org
Mustruia18 – Empresa de Libras, Inclusão e Ensino
Núcleo de Apoio Jurídico do Grupo TransDiversidade Niterói
Nucleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT+ da Universidade Federal de Minas Gerais
NUPSEX – Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero/UFRGS
OBSERVATÓRIO CEARENSE DE MORTES E VIOLÊNCIAS CONTRA LGBTI.
Oficina de Criação de Filmes
ONG Gardênia Azul Diversidade
ONG Minha Criança Trans
Papo de Meia
Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e da Mulher
Projeto Vozes e Cores
Rede de Estudantes Trans e Travestis Organizades da UERJ
Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBTQIA+
Rede TransVestis UFFianas
Revista Brejeiras
Revista Híbrida
Secretaria de Estado de Saúde – RJ
Sindicato dos Profissionais da Educação Pública de MT
Transempregos
TriboQ
União Brasileira de Mulheres -UBM
Universidade Resistência e Direitos Humanos – Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão/UERJ

NOTA PÚBLICA DA ANTRA sobre o “congresso brasileiro pelo direito de ser transfóbico”

Direitos e Política, Notas e Ofícios, Saúde

A ANTRA vem a público informar que tomou conhecimento sobre a organização de um evento[1] onde os organizadores se utilizam de malabarismos retóricos para mascarar a transfobia do mesmo, mobilizado por pessoas desonestas sobre suas reais intenções e que utilizam a transgeneridade para confundir a sociedade, e fazer parecer que se trata de alguma mobilização em prol dos nossos direitos quando na verdade são pessoas transfóbicas que pretendem disseminar mitos sem base científica e perpetuar estigmas sobre pessoas trans.

Em uma olhada rápida, engana-se quem pensa que o evento seria pró-trans. Nitidamente os debates propostos e temas como “epidemia trans” (mito criado que consiste em tentar afirmar que a transgeneridade seria transmitida de uma pessoa para outra ou capaz de incentivar pessoas a “virarem trans”), a realização de cirurgias de “redesignação sexual em crianças” (que não são realizadas em menores de 18 anos no Brasil) e a associação entre transgeneridade e abuso sexual, já denunciam o viés transfóbico do congresso.

Além da própria constituição de um debate que inclui um viés negacionista e anticientífico com a inclusão de teorias conspiracionistas frente as informações, dados e pesquisas que tem sido publicadas nos últimos anos e que atestam a importância do acesso aos cuidados em saúde para pessoas trans e que sugiram abordagens terapêuticas não patologizantes. Especialmente quando a própria Organização Mundial da Saúde (OMS), na sua mais recente versão do CID em sua 11ª revisão, retirou a transgeneridade do código de doenças[2] e atestou tratar-se de uma condição humana.

Assim como o Conselho Federal da Psicologia (CFP), em sua resolução nº 01/2018[3] recomenda os cuidados que considerem o acolhimento e não discriminação, assim como são proibidas no país as terapias de reorientação sexual e/ou de gênero ou qualquer tipo de cuidado que considere a transgeneridade como uma doença. Esse tipo de iniciativa viola ainda todos tratados sobre os direitos de crianças e adolescentes, e as recomendações de organizações que pesquisam o tema.

Além disso, é flagrante que na construção do evento haja a inclusão e o uso de informações inverídicas, e que pretendem negar o acesso aos cuidados que considerem o desejo expresso das pessoas trans e suas autonomias. Assim como também há o uso de termos ultrapassados e informações já superadas por estudos contundentes sobre a qualidade de vida de jovens e crianças trans que encontram um ambiente acolhedor e favorável a transição social, e os efeitos positivos que o acesso as modificações corporais traz para a população trans.

Ao observar mais detalhadamente os nomes dos palestrantes, além de muitos já serem conhecidos por abordagens transfóbicas e que lançam mão do transpanic, identificamos a completa ausência de pessoas trans compondo ou participando, especialmente pesquisadores e profissionais trans da área de saúde ou especialistas que pesquisam o tema. Assim como não há a participação de qualquer instituição de referência na luta pelos direitos trans na organização ou dentre os apoios. E o que vemos são diversas instituições que sequer tem qualquer acumulo, seja na teoria e pesquisa, no atendimento ou mesmo na prática sobre as necessidades e o atendimento humanizado das pessoas trans.

Notamos com muita preocupação que o congresso conta ainda com a participação do responsável pelo ambulatório trans que atende crianças e jovens trans em SP. Já conhecido por suas posições altamente retrógradas e patologizantes, algumas delas apontadas aqui: https://antrabrasil.org/2019/04/07/nota-publica-repudio-entrevista-dr-alexandre-saadeh-ao-portal-universa/amp/ e aqui https://antrabrasil.org/2019/04/24/o-mito-da-disforia-de-inicio-rapido-e-de-contagio-social-mencionada-por-alexandre-saadeh/amp/, assim como também consta a participação da pessoa responsável por tentar difundir a ideia de que exista uma epidemia trans (SIC) em curso no país, e que teve uma palestra cancelada pelo reconhecimento do absurdo que esse tema sugere.

Em nossa perspectiva, esse congresso não passa de uma tentativa de organizar uma política antitrans, e que deliberadamente ignora a completa falta de políticas públicas que garantam esse acesso a jovens trans no país, a urgência da luta pelo fortalecimento da política no Sistema Único de Saúde (SUS) como o processo transexualizador que vem sendo sucateado ou a quantidade insuficiente de ambulatórios e hospitais de referência nos cuidados específicos da saúde trans. Dessa forma, tentando confundir a população com a difusão de ideias que incentivam e promovem diversas violações de direitos e levam ao sofrimento físico e mental de pessoas trans, ao negar os efeitos positivos que o acesso aos cuidados em saúde propiciam, incluso o bloqueio hormonal, e o quanto o acesso a esse tipo de cuidado já se mostrou eficaz e seguro sob diversas óticas e seus resultados.

Precisamos estar atentas a quem está organizando e de onde vem o financiamento para esse tipo de evento que conta com apoio de instituições que tentam se isentar, mas que estão contribuído para a institucionalização da transfobia, sobretudo nos cuidados em saúde.

Estamos mobilizando ações e diversas frentes de mobilização com vários grupos para ver que tipo de providências podem ser tomadas diante de mais essa tentativa de disseminar fakenews e teorias fundadas na transfobia e no ódio a liberdade e diversidade de gênero. E solicitamos as pessoas que parem de compartilhar qualquer tipo de informação, link, print ou mídia que levem a visibilidade para ações transfóbicas, e que se possível encaminhem para instituições e órgãos que possam tomar providências, exigindo respostas e ações concretas.

Recomendamos ainda o imediato cancelamento desse evento e que a disseminação de seus ideais sejam interrompidas sob o risco de danos gravíssimos para as pessoas trans.

Brasil, 13 de maio de 2022.

Associação Nacional de Travestis e Transexuais

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[1] Optamos por omitir nomes e informações que contribuam para a disseminação do evento ou de seus organizadores visto que a existência de algo tão vil já é de conhecimento público de grande parte das pessoas que lutam pelos direitos trans.

[2] https://brasil.un.org/pt-br/83343-oms-retira-transexualidade-da-lista-de-doencas-mentais

[3] https://site.cfp.org.br/tag/resolucao-01-2018/#:~:text=A%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%20CFP%20n%C2%BA%2001,desenvolvimento%20de%20culturas%20institucionais%20discriminat%C3%B3rias.

NOTA PÚBLICA DA ANTRA EM LUTO POR LORENA MUNIZ E SOBRE A SAÚDE TRANS

Direitos e Política, Notas e Ofícios, Ofícios e Notas, Saúde

A ANTRA vem a público prestar solidariedade a Lorena Muniz, seus familiares, amigos e demais apoiadores neste momento de luto, que estiveram envolvidos na busca por garantir um atendimento digno e humanizado a respeito da negligencia que levou sua vida. E aproveita também essa nota para denunciar o descaso com que o caso foi tratado pela equipe da clinica onde ela estava fazendo o procedimento, assim como a forma com que o estado brasileira tem tratado a saúde das travestis e demais pessoas trans.

Lorena saiu de Pernambuco com destino a São Paulo a fim de realizar o desejo de fazer uma cirurgia para colocar implantes de mama (próteses). No entanto, no dia de sua cirurgia, vídeos postados na internet denunciaram que a clínica havia enfrentado um sinistro envolvendo incêndio e durante a evacuação do prédio, Lorena foi deixada para trás pelos responsáveis pela sua intervenção cirúrgica.

Cabe ressaltar que, de acordo com as informações de pessoas presentes no ocorrido, ela ainda estava sedada aguardando a cirurgia e ao ser abandonada pela equipe da clínica, acabou inalando uma alta quantidade de fumaça e gás carbônico, que ocasionou um agravamento na sua saúde. Ela foi socorrida e transferida às pressas para atendimento hospitalar em estado gravíssimo e infelizmente não resistiu e veio a óbito. Lembramos ainda que nas primeiras notícias veiculadas pela mídia sobre o incêndio na clínica, foi noticiado que não havia vítimas e também foram relatadas diversas tentativas de invisibilizar, atrapalhar ou ocultar a situação grave que acometeu Lorena. Também destaca-se o descaso da clínica que até o momento não prestou qualquer apoio à vítima ou familiares.

Infelizmente, Lorena é mais uma vítima da opressão de gênero, da pressão estética cissexista e do descaso do estado nos cuidados da saúde específica da população trans. E este não é um caso isolado.

Esse caso ganhou repercussão rapidamente nas redes sociais, pois essa clinica é muito procurada, especialmente por pessoas Trans de todo o Brasil para os seus interventos, mas é de se espantar a falta de cuidados com esse caso. Também foram as redes sociais que viralizaram um vídeo feito pelo seu namorado Washington Barbosa denunciando a situação, apenas três dias do ocorrido. A partir daí uma intensa mobilização aconteceu para que ele pudesse chegar a São Paulo e acompanhar a sua namorada de perto. Esse caso também está sendo acompanhado pelas equipes da deputada Erica Malunguinho e da vereadora Erika Hilton.

Sabemos que há uma fila de espera de anos para o acesso aos procedimentos previstos no processo transexualizador do SUS, que enfrenta dificuldades pela falta de investimentos e pelos congelamentos dos gastos em saúde, onde não há profissionais, hospitais e ambulatórios suficientes no país e que durante a pandemia houve uma paralisação em cerca de 70% nas cirurgias[1] e atendimentos previstos para a saúde específica das pessoas trans. Todo esse cenário de descaso, abandono e exclusão, aliados a transfobia institucional e a invisibilidade de nossas pautas em espaços de discussão e construção sobre direitos sociais, faz com que grande parte da população trans acabe se submetendo a modificações corporais pouco planejadas, realizem procedimentos clandestinos e/ou hormonização sem acompanhamento médico especializado, sendo obrigadas a buscar profissionais que acabam por se aproveitar de nossa vulnerabilidade, expondo a população Trans a poucas garantias de resultados satisfatórios e uma assistência quase inexistente durante o processo posterior aos procedimentos. Especialmente aqueles profissionais conhecidos por nos tratarem como mercadoria e sem nenhum compromisso com nossas vidas.

Isso, inclusive tem impacto na baixa estimativa de vida da população Trans. Que enfrenta os piores índices de acesso à saúde e aos cuidados relacionados à transição ou à saúde específica. Enfrentando ainda uma formação médica deficiente para o cuidado dos corpos trans, além das transfobias institucionais nas unidades de saúde que acabam por não respeitar a identidade de gênero ou o nome social, causando o afastamento de nossas populações das buscas pelos cuidados em saúde.

Muitas dessas clínicas e médicos são bem conhecidas pela população Trans pelo baixo preço oferecido e pelo acesso facilitado com pouco rigor no processo pré-cirúrgico, nos espaços onde são feitas as consultas e cirurgias, e pelo fato de não existir fiscalização específica para esses profissionais que mantém uma rede de atendimento que utiliza casos satisfatórios de resultados como propaganda, mas apaga os erros médicos e ignora/silencia pacientes que enfrentam problemas.

Não podemos deixar esse caso impune. É urgente que a discussão sobre a garantia do acesso e cuidados com a saúde da população Trans faça parte do cotidiano de gestores, parlamentares, trabalhadores da saúde, e de toda a sociedade, a fim de que possamos construir estratégias de acolhimento das demandas, melhoria nos serviços e ampliação da rede de cuidados. Envolvendo a formação médica especializada, capacitação das equipes técnicas e unidades de saúde para o atendimento de nossa população e para o enfrentamento de casos como o de Lorena, pois infelizmente não é o único.

Nossa mais profunda solidariedade ao Tom e familiares de Lorena. Que o conforto chegue a seus corações nesse momento tão difícil. Seguiremos juntas e gritando por ela para que este caso, tenha um desfecho que seja capaz de trazer justiça aos responsáveis pela sua morte e todo sofrimento causado à sua família, amigos e pessoas que tiveram contato com esse triste episódio. E nos colocamos inteiramente empenhadas a fortalecer a luta contra impunidade e pela responsabilização dos culpados.

Não podemos deixar esse caso sem solução e tampouco deixar de lutar pelo SUS universal, equânime e integral para garantia de nossas vidas saudáveis. Seguiremos em luto, na luta.

REST IN POWER LORENA!

Brasil, 21 de fevereiro de 2021

Associação Nacional de Travestis e Transexuais

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[1] Cirurgias do processo transexualizador caem 70% em 2020 e denúncias de “esvaziamento” na saúde revelam risco para população trans. http://www.generonumero.media/saude-trans/

Como acessar o SUS para questões de Transição?

Direitos e Política, Saúde

trans

Constante somos procuradas sobre dúvidas em relação para acesso ao processo transexualizador do SUS e sobre quais procedimentos temos garantido o direito, além do funcionamento e fluxo de atendimento.

Organizamos algumas informações, mas é imprescindível que todas as pessoas possam ler e acessar a Politica Nacional de Saúde Integral LGBTI do Ministério da Saúde e a própria portaria que instituiu o processo Transexualizador do SUS. Assim como a atualização do CID-11 que despatologizou as identidades trans.

Em 2006, o SUS introduziu, por meio da Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, o direito ao uso do nome social, pelo qual travestis e transexuais se identificam e escolhem ser chamados socialmente – e não apenas nos serviços especializados que já os acolhem, mas em qualquer outro da rede pública de saúde. O Processo Transexualizador foi instituído em 2008, passando a permitir o acesso a procedimentos com hormonização, cirurgias de modificação corporal e genital, assim como acompanhamento multiprofissional. O programa foi redefinido e ampliado pela Portaria 2803/2013, passando a incorporar como usuários do processo transexualizador do SUS os homens trans e as travestis, tendo em vista que até então apenas as mulheres trans eram assistidas pelo serviço.

Não utilizamos o termos Afirmação de Gênero, pois partimos de uma ideia onde nenhuma modificação corporal (ou a ausência dela), apesar de serem importantes, definem nossa transgeneridade e que nosso gênero já está muito bem estabelecido quando optamos por qualquer mudança. Portanto, utilizamos o termo cirurgias de modificações corporais quando nos referirmos aos procedimentos cirúrgicos.

A criação do processo transexualizador do SUS sinaliza-se como importante avanço na universalização desta à população trans brasileira e uma grande conquista dos movimentos sociais. Contudo, a efetivação desse programa ainda coloca alguns desafios para gestores e trabalhadores do SUS. Mas especialmente pela população Trans, visto que ainda são poucos serviços e há questões que limitam o acesso a maior parte de nossa população.

O cuidado com a população trans é estruturado por dois componentes: a Atenção Básica e a Atenção Especializada. A Básica refere-se à rede responsável pelo primeiro contato com o sistema de saúde, pelas avaliações médicas e encaminhamentos para tratamentos e áreas médicas mais específicas e individualizadas.

A Especializada é dividida em duas modalidades: a ambulatorial (acompanhamento psicoterápico e hormonização) e a hospitalar (realização de cirurgias de modificação corporal e acompanhamento pré e pós-operatório).

Para todas as pessoas, a idade mínima para procedimentos ambulatoriais é de 18 anos. Para os hospitalares, ela aumenta para 21 anos. Qualquer indivíduo pode procurar o sistema de saúde público e é seu direito receber atendimento humanizado, acolhedor e livre de discriminação.

Até o momento, de acordo com o Ministério da Saúde, os únicos hospitais que podem realizar cirurgias de transgenitalização no Brasil pelo SUS são o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, o HC da Universidade Federal de Goiás, em Goiânia, o HC da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife, o HC da Universidade de São Paulo e o Hospital Universitário Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro. Apenas três unidades fazem acompanhamento preventivo, com foco em crianças e adolescentes de 3 a 17 anos. Uma das unidades está na capital de São Paulo; outra, em Campinas; e a terceira, em Porto Alegre.

Para ter acesso aos serviços do processo transexualizador do SUS, é preciso solicitar encaminhamento na unidade básica de saúde mais próxima da sua residência. Os procedimentos mais procurados são a hormonização, seguidos de implantes de próteses mamárias e cirurgia genital em travestis e mulheres trans, assim como a mastecomia e histerectomia no caso dos homens trans. A faloplastia ainda é feita em caráter experimental no Brasil.

Importante atentar para as filas de acesso – que hoje variam em mais de 10 anos para a redesignação sexual, e buscar informações sobre os procedimentos necessários para acesso a tratamento fora de domicílio (TFD) pelo SUS, para aquelas pessoas que moram em cidades onde não hajam serviços especializados.

Requisitos básicos para acesso ao processo Transexualizador:

  • Maior de 18 anos para iniciar processo terapêutico e realizar hormonização;
  • Maior de 21 anos para cirurgias de redesignação sexual, com indicação médica; e
  • Necessidade de avaliações psicológicas e psiquiátricas durante um período de 2 anos, com acompanhamentos e diagnóstico final que pode encaminhar ou não a paciente para a cirurgia tão aguardada.

IMPORTANTE: A cirurgia plástico-reconstrutiva da genitália externa, interna e caracteres sexuais secundários não constitui crime de mutilação previsto no artigo 129 do código penal brasileiro, haja vista que tem o propósito terapêutico (RESOLUÇÃO CFM nº 1.652/2002)

Desde junho deste 2019, a transexualidade não está mais na lista de doenças da Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo a entidade, a transexualidade passa a integrar como “incongruência de gênero” a categoria denominada “condições relativas à saúde sexual”.

Principais alterações na Resolução 2265/2019 do Conselho Federal de Medicina, que dispõe sobre o cuidado específico à pessoa transgênera:

• A adoção da nomenclatura médica da transexualidade como “incongruência de gênero” nos termos da atualização da CID feita pela OMS em junho de 2018;
• A previsão do Projeto Terapêutica Singular (PTS) que servirá para elaborar o conjunto de propostas terapêuticas articuladas do paciente, que deve ser objeto de discussão coletiva da equipe multiprofissional e interdisciplinar com participação de cada indivíduo e de seus responsáveis legais; .
• Para crianças e adolescentes na pré-puberdade: previsão somente do acolhimento e do acompanhamento por equipe multiprofissional e interdisciplinar; .
• Para crianças e adolescentes em puberdade: previsão da possibilidade de bloqueio hormonal que consiste na interrupção da produção de hormônios sexuais, impedindo o desenvolvimento de caracteres sexuais secundários do sexo biológico. Prática condicionada à anuência da equipe multiprofissional e do responsável legal do paciente;
• Para adolescentes a partir dos 16 anos: previsão da possibilidade da hormonoterapia cruzada que é a reposição hormonal na qual os hormônios sexuais e outros medicamentos são administrados nas pessoas trans para desenvolverem a feminização ou masculinização de acordo com a sua identidade de gênero. Prática condicionada à anuência da equipe multiprofissional e do responsável legal do paciente; • Previsão de realização de procedimento cirúrgico somente a partir dos 18 anos e com acompanhamento prévio mínimo de 01 ano por equipe multiprofissional e interdisciplinar; e .
• Avanço na cirurgia de metoidoplastia para homens trans que deixa de ter caráter experimental.

Contudo a portaria do SUS ainda não foi atualizada, onde os requisitos permanecem os mesmos da Portaria vigente. 

Lembramos ainda sobre a necessidade de seguir atentas junto ao ministério da saúde, pois é lá que as recomendações precisam de fato ser homologadas para entrar em prática, e o cenário que temos naquele ministério é o pior possível. Visto os desmontes que temos acompanhado desde a Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos, que congelou o investimento nas políticas de saúde, alem dos retrocessos e constantes ataques ao SUS.

ATENÇÃO: O Ministério da Saúde ainda não homologou a CID-11 ou atualizou os protocolos previstos na portaria do Processo Transexualizador, assim como ainda não homologou a resolução do CFM (mencionada ao longo do texto) que traz atualizações sobre o atendimento de saúde a população trans. Portanto, em uma nítida violação dos direitos trans e recomendações/normas previstas pela própria OMS.

Estamos trabalhando para mudar essa realidade, mas é provável que sigamos vendo exigências de laudos ou enquadramentos equivocados pelo CID-10.

Desta forma seguiremos na luta pela despatologização das identidades Trans, e o contra o ato médico sobre nossos corpos. Sempre em busca da garantia do respeito a autonomia do sujeito, sua autodeterminação e o acesso à saúde sem um viés biologizante ou genitalista.

Lista de unidades de saúde no Brasil

  • Centros de referência com atendimento ambulatorial e hospitalar (cirúrgico):
Hospital Cidade
UFG – Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás Goiânia/GO
UFRGS – Hospital de Clínicas de Porto Alegre Porto Alegre/RS
UFP – Hospital das Clínicas Recife/PE
UERJ – Hospital Universitário Pedro Ernesto Rio de Janeiro/RJ
FMUSP – Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina São Paulo/SP
  • Ambulatórios do SUS:
Ambulatório Cidade
CPATT – Centro de Pesquisa e Apoio a Travestis e Transexuais Curitiba/PR
Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Rio de Janeiro/RJ
Hospital Universitário Professor Edgard Santos Salvador/BA
Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS São Paulo/SP
Ambulatório do Hospital das Clínicas de Uberlândia Uberlândia/MG
Hospital Universitário Cassiano Antônio de Moraes Vitória/ES
  •  Ambulatórios das redes de saúde estaduais:
Ambulatório Cidade
Ambulatório Transexualizador da Unidade Especializada em Doenças Infectoparasitárias e Especiais Belém/PA
Ambulatório de atenção especializada no Processo Transexualizador do Hospital Eduardo de Menezes Belo Horizonte/MG
Ambulatório Trans do Hospital Dia Brasília/DF
Ambulatório LGBT Darlen Gasparelli Camaragibe/PE
Ambulatório de Saúde de Travestis e Transexuais do Hospital Universitário Maria Pedrossian Campo Grande/MS
Centro de Saúde Campeche Florianópolis/SC
Centro de Saúde Estreito Florianópolis/SC
Centro de Saúde Saco Grande Florianópolis/SC
Ambulatório de Saúde Trans do Hospital de Saúde Mental Frota Pinto Fortaleza/CE
Ambulatório de Transexualidade do Hospital Geral de Goiânia Alberto Rassi Goiânia/GO
Ambulatório para travestis e transexuais do Hospital Clementino Fraga João Pessoa/PB
Ambulatório de Saúde Integral Trans do Hospital Universitário da Federal de Sergipe Lagarto/SE
Ambulatório LGBT Patrícia Gomes, Policlínica Lessa de Andrade Recife/PE
UPE, Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros Recife/PE
Ambulatório LBT do Hospital da Mulher Recife/PE
Ambulatório de Estudos em Sexualidade Humana do HC Ribeirão Preto/SP
Ambulatório do Centro Estadual de Diagnóstico, Assistência e Pesquisa Salvador/BA
Ambulatório trans do Hospital Guilherme Álvaro Santos/SP
Ambulatório Municipal de Saúde Integral de Travestis e Transexuais São José do Rio Preto/SP
Ambulatório AMTIGOS do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas São Paulo/SP
Ambulatório Roberto Farina, UNIFESP São Paulo/SP
UBS Santa Cecília São Paulo/SP
Ambulátorio de Saúde Integral de Travestis e Transexuais João W. Nery Niterói/RJ

Por Bruna Benevides

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Referências:

Guia Disforia de Gênero – Sociedade Brasileira de Pediatria, n° 4, jun/2017

Depto de DCCIST

Ministério da Saúde (1)

Ministério da Saúde (2)

Secretaria de Saúde do ES

LeiaJá

Diário de Pernambuco

Agência AIDS

G1

Agência Brasília

Reddit – Lista de Ambulatórios Trans

Nota sobre a atuação da ANTRA em prol da população Trans em tempos do COVID-19

Direitos e Política, Saúde
Nota sobre a atuação da ANTRA em prol da população Trans Brasileira em tempos do COVID-19
 
Diante da crise do coronavírus, nós da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) temos recebido diversas mensagens solicitando informações sobre ações a respeito da população de travestis e transexuais, especialmente aquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade social.
 
Neste sentido, orientamos a população de travestis e transexuais a ficarem atentas sobre as medidas que estão sendo tomadas localmente, e que busquem auxílio e interlocução junto as instituições nos seus municípios e estados, afim de que possam estar sendo beneficiadas pelas ações que o poder público tem tomado.
 
Informamos ainda que a ANTRA é uma rede que articula e faz interlocuções entre a sociedade civil e o poder público a fim de garantir direitos, mas que a responsabilidade de garantir saúde, segurança, emprego e renda, bem estar social e seguridade, é de responsabilidade do estado. E nós enquanto instituição seguiremos na resistência para garantir esses direitos e inclusive enfrentar as violações dos direitos humanos.
 
Estamos em uma situação que requer atenção, e a participação de todas as pessoas para o enfrentamento dos agravos que poderão surgir para as pessoas trans que estão impossibilitadas de trabalhar devido a necessidade de quarentena por conta do coronavírus é imprescindível nesse momento.
 
Pedimos cautela a todas as pessoas e desejamos que juntas possamos enfrentar mais esse momento difícil sem deixar ninguém para trás e contribuindo para ajudar aquelas pessoas que estão necessitadas de uma atenção especial neste momento. Não dispomos de apoio financeiro de qualquer natureza, e não contamos com nenhum tipo de renda, visto que somos uma instituição não governamental, sem fins lucrativos, e que tem realizado ações e atividades contando exclusivamente com pessoas voluntárias que entendem a importância de nossa luta.
 
Nesse sentido, temos desenvolvido algumas ações e dentre elas destacamos: o monitoramento da violência neste período, mapeando e publicizando campanhas de apoio a instituições que estão se organizando em prol das pessoas trans no território nacional; criamos e publicamos a divulgação de uma cartilha específica para cuidados daquelas pessoas que trabalham na prostituição; temos divulgado matérias veiculadas nos jornais a respeito desse tema, além de compartilhar ações de emergências que nossas afiliadas estão desenvolvendo pelo Brasil; e em total atenção as profissionais do sexo que seguem trabalhando na pista.
 
Compartilhamos a veiculação da matéria que trouxe informações sobre as medidas que estão sendo tomadas pelo governo federal a fim de garantir o acesso a população trans – como é a previsão do fundo emergencial de R$200,00 que está em vias de ser publicado, e apenas teremos essa publicação via decreto ou projeto de lei que divulgaremos amplamente para o conjunto de nossas associadas e parceiros.
 
Acompanhe nossas redes sociais para informações e caso necessitem de qualquer apoio para ações de fortalecimento, divulgação e ajuda as travestis, mulheres transexuais, homens trans, transmasculines e demais pessoas trans brasileiras, nos colocamos inteiramente a disposição para contribuir da maneira que for possível. Seguiremos fazendo controle social e na luta pelas pessoas Trans.
 
Salvador, 24 de março de 2020.
 
Keila Simpson
Presidenta da ANTRA
ANTRA

NOTA DE REPÚDIO  DA ANTRA À ATIVIDADE INTITULADA ”EPIDEMIA TRANS”.

Direitos e Política, Saúde

A ANTRA vem a público manifestar o seu repúdio perante a realização de um evento previsto para acontecer na assembléia legislativa do Rio Grande do Sul, que tem como objetivo principal disseminar informações tendenciosas e de cunho patologizante em relação aos cuidados de saúde das pessoas trans, especialmente crianças e adolescentes, com intuito de negar o acesso à saúde dessas pessoas.

Inicialmente denominada como EPIDEMIA TRANS (SIC), fica nítido o tipo de abordagem que será apresentado pela palestrante, como se a transgeneridade fosse algo passível de ser contagioso ou transmitido de uma pessoa para outra. Tais informações e representações a respeito das identidades trans não se baseiam em nenhuma evidência científica consolidada e estão completamente equivocadas.

Ela sugere que os jovens e crianças seriam de alguma forma “sugestionáveis” a se tornarem transgêneros (quando de alguma outra forma não seriam) em decorrência de alguma espécie de moda ou contágio social. Tais alegações acabam não apenas sendo imprecisas e cientificamente infundadas, mas também coniventes com a reafirmação de estigmas e incompreensões que precisam ser urgentemente superadas, tal como a noção, mesmo que vaga, de que as identidades trans constituem um perigo social a ser evitado.

Inverte a lógica da luta por visibilidade, sugerindo que a representatividade trans nos diversos espaços sociais estaria “incentivando” que pessoas cisgêneras passassem a se identificar como trans – bem semelhante ao discurso fundamentalista que designa e sustenta a “ideologia de gênero” como algo maligno. Abrindo mão de observar as singularidades de cada pessoa e que o fato das lutas trans estarem saindo da invisibilidade ter permitido com que mais pessoas pudessem ser quem são de verdade e passem reivindicar as suas reais existências, não mais sob um viés normativo-cisgênero.

Não existe nenhuma evidência científica capaz de sustentar a ideia de que as identidades trans sejam uma “moda” capaz de “confundir” pessoas suscetíveis. Pesquisas que especulam uma nova forma de ‘’disforia de gênero de surgimento rápido’’ (que atingiria particularmente meninas jovens) estão profundamente comprometidas em função de falhas metodológicas e vieses ideológicos.

E que após a reação de grupos organizados que lutam pelo direito das pessoas trans, houve uma mudança no título com intuito de manipular a opinião pública e a real intenção do evento. Ignorando os avanços das pesquisas e discussões sobre a autonomia e os efeitos positivos de um desenvolvimento livre de estigmas e preconceitos contra a condição trans, para justificar um olhar extremamente arcaico e patologizante e que mantém o poder do saber médico, tendo controle sobre a individualidade da pessoa. A referida palestrante demonstra em seus vídeos, escritas e artigos publicados, uma escolha tendenciosa ao ignorar os efeitos positivos de uma transição em ambiente acolhedor das demandas destas crianças e adolescentes, de forma evitar conflitos e enfrentar agravos na saúde física e mental dessas pessoas pelo não acesso a uma transição social que ele garanta o desenvolvimento pleno de sua subjetividade. Negando a autonomia em busca do reconhecimento da sua própria identidade de gênero, por autodeterminação, como prevêem diversos tratados internacionais e instituições de saúde como a própria Organização Mundial da Saúde, além do previsto no CID-11, atualizado em 2018.

Vemos assim uma defesa violenta do padrão cissexista como norma, onde a própria palestrante resolve abrir mão dos avanços das discussões e estudos atualizados sobre as abordagens terapêuticas a respeito da transgeneridade. Indo de encontro ao próprio entendimento do Conselho Federal de Medicina que reconhece o direito de crianças e adolescentes trans ao acesso à saúde, o que muito nos preocupa. Visto que em nosso entendimento esta abordagem extrapola seu campo de atuação e fere a ética médica ao incidir na divulgação de informações deturpadas que podem trazer diversos efeitos negativos para nossa população.

De forma alguma queremos imputar censura ou impedir o diálogo, acreditamos no avanço das discussões a fim de garantir direitos e não o oposto. E caso a referida palestra apresentasse realmente o sentido de ajudar no debate que se propõe, seriamos as primeiras a defender que o contraditório se estabelecesse, para que a partir daí outro olhar pudesse ser constituído. Mas na verdade o que vemos é um retrocesso bem arquitetado sob o olhar fundamentalista de gênero que está em evidência.

Neste sentido, repudiamos veementemente que esse tipo de atividade ocorra com intuito único de atacar as recentes conquistas de crianças e adolescentes trans, alem da tentativa de negar a estas pessoas o acesso à saúde, e a seus responsáveis que sigam acolhendo seus filhos sem nenhum tipo de discriminação e garantindo o desenvolvimento dos filhos em ambientes saudáveis.

O que precisamos de fato é enfrentar esta Epidemia de ódio que se disfarça de cuidados em nome da manutenção do status de subalternidade das pessoas trans.

Salvador, BA. 04 de março de 2020.

KEILA SIMPSON – Presidenta da ANTRA

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